7.5.14

Polaroid

Do vinho raro,
em cálice ao alto:
oxalá as pétalas doravante
sejam a maresia de agora.

Com os trinados dos estorninhos
derrotando a melancolia;
o céu pontuado por nuvens arquitetónicas
ungido pela luz clara;
os ossos possuídos pela força
e os dedos congeminando seus sonhos;
divindades imaginadas
compondo as preces necessárias;
as bocas unidas na combustão
que incinera sobressaltos;
e os corpos quentes
abraçados num frémito insaciável.

Os amanhãs que se não empenhem
no tirocínio do presente;
as ondas do mar
que tragam as novas que importam;
uma peregrinação algures
e os olhos virados do avesso,
em redescoberta;
as cambiantes do ser
que deixem de ser autofagia;
as mãos que se dão
limpando o suor pretérito;
um livro aberto, de páginas brancas,
à espera das palavras acertadas.

E as palavras:
arranjos florais
melodias sem peias
formulações simplificadas
(dos mais complexos devaneios)
proclamações solenes de jactância,
mas de uma vaidade lhana, sincera,
feliz.

Tragam esse raro vinho
deposto nos mais valiosos cálices.
Que sejam bem alto erguidos
nas loas ao porvir que fazemos.
Saciemo-nos nesse vinho,
nem que seja até à embriaguez.
Não,
não serão os sentidos adulterados:
será a deposição dos vultos nefandos,
a nossa entronização como deuses sublimes.
Até que no cais luminoso,
diante da maré sôfrega e da maresia explosiva,
todos os segundos contem.
Sem digestão do tempo
sem desgastar o tempo
sem apressar o tempo,
o escasso tempo,
em banais tergiversações.

Para, enfim,
tudo ser repleto,
tudo ser completo.
E a medida maior se antolhar
no maior que se encerra no interior de nós.