12.6.07

Paródia dos pecados

Tomba sobre os pecadores
a asfixia do impudor.
Debatem-se com a consciência atormentada
tantos os pecaminosos, impérvios caminhos
dos esbulhados da moral.

Há sacerdotes que expiam os pecados
e espiam consciências.
Sacerdotes que tratam da moral,
eles, tão puros
tão imunes aos devaneios transgressores.

Batem à porta dos pecadores angustiados
a qualquer hora
patrulhas de generosas almas
que rondam, atentas,
os sumiços das consciências.

Dizem que há um rebanho
apascentado pelos pastores que se entregam
à bondosa militância dos passos certeiros.
E que os pecados são o encantamento demoníaco
a cancela que afasta a virtude.

Quem lhes assegura que queremos a virtude?
Quem lhes assegura o que é a virtude?
Sacerdotes aprimorados afivelam os costumes
encaixilham-nos no vetusto celofane
dos seus herméticos quadros mentais.

Os outros,
os dissidentes da normalidade,
amedrontados pelo tortuoso futuro que os espera
na embocadura do encarniçado inferno.
Os outros, apenas vigiam o seu tumulto interior.

Os sentinelas da moralidade alheia
perseguem o sacerdócio:
é a sua vez de chamar a sublevação
a deles contra a dos pecaminosos amotinados;
pungente altruísmo ou advogados em causa própria?

Os desvalidos teimam em pecaminosos actos
e provocam, renovando mais pecados.
Sobra a excomunhão
– como se carecesse depurar o rebanho
acantonar os excluídos à condição de párias.

Não que lhes desassossegue o espírito,
aos amotinados da pacotilha sacristã,
pois a fé lhes é risível coisa.
Na glote fica-lhes o doce sabor da transgressão
mais doce quanto mais censurada pelos guardiães.

Os fantasmas que acenam
e a monstruosa tarefa reservada
aos que teimam na herética errância:
apenas um cabo de trabalhos aos seus fautores.
Os únicos inquietados com desvios alheios.

Os destinatários
sossegados na impureza do pecado
hão-de prosseguir no sono plácido.
Não são eles que bebem a cicuta
por não haver no “pecado” veneno algum.

Miseráveis
hão-de continuar os vigilantes dos outros.
Ao saberem que os campos do pecado
são sulcados por um rebanho numeroso.
Cada vez mais numeroso.