10.1.06

Em demanda da ternura

Escolher para ti um trono de ternura.
Regressar aos beijos
repousados na tua pele branca.
Soltar as amarras
que enregelam os afectos.

E depois,
pela noite,
acolher-te nos meus braços
residência dúctil para a tua fragilidade.
Sem aprisionar a leveza escondida.

Lá fora,
enquanto sopra a ventania invernal,
escondem-se os fantasmas de antanho.
Braços férreos empurram-nos
para latitudes distantes.

Os fantasmas,
como o vendaval,
escurecem a gélida distância cultivada.
São a bolorenta lassidão dos dias
que se dobram, repetitivos, esquálidos.

Há lugar a toda a ternura de outrora.
Haja força para derrotar
as vesgas madrastas que não ficaram vergadas.
Rancorosas, teimam em fertilizar
a pantanosa existência.

Haja forças; mas encontrá-las,
mister difícil?
Só nas acabrunhadas facetas
do asceta que vive mergulhado
na escuridão de afectos.

Varram-se as lâminas pedantes
das profecias negras que ondeiam;
Enxotadas sejam
e reentre o excitante hábito
de saborear as pétalas adocicadas da ternura.

Outra aventura será só misericordiosa
do pleito pela comiseração.
Camisa-de-forças anestesiante
que faz passar os dias
como se longos minutos fossem.

Perder o tempo,
ele já tão fugaz?
Tontice de um louco
que não escuta a poeira louca
apoderada dos seus sentidos.

Tudo ou nada
– sem lugar ao intermédio.
Ou a nau que parece parada;
no rebobinador da existência,
a consciência que andava, sorrateira.

Inércia letal,
divã de um comodista apaziguamento.
Recobra a quentura em ti,
espolia essa inércia
nas prateleiras do perdível.

Saberás então
que um sussurro lânguido
preenche todo o espaço
que vai daqui até à lua.
Ela, vigilante, espera pela demanda.