13.4.07

Um sonho semântico

Esta noite sonhei
vezes sem conta
que dizia
vezes sem conta
paroxismo.
Mesmo sem saber o que significa
paroxismo.

No sonho
enamorava-me com a palavra
paroxismo.
Como se discursasse eloquentes palavras
sempre rematadas com um sagrado “paroxismo”.
A audiência extasiava-se sempre que pronunciava
paroxismo.
O orador enfatuava,
testemunha da exaltação da audiência:
e ia repetindo
vezes sem conta
paroxismo
paroxismo
paroxismo.

Ao acordar bati à porta do dicionário:
“a maior intensidade de uma dor, de um prazer,
agonia antes da morte (medicina)
do grego, auge”.
Porque haveria o onírico de trazer
o paroxismo
– perguntei-me, vezes sem conta.
O pior é que nem me lembrava
de que matéria era feita o sonho
para convocar o paroxismo.
Às tantas
é apenas uma tropelia onírica
a armadilha onde são capturados
os sentidos adormecidos.
Não sei se seria exorcismo
ou outro ismo qualquer:
aquela noite foi epílogo
no rosário dos sonhos surrealistas
que dariam para preencher páginas de livros
ou pintar obtusas telas com cores garridas.

O mistério fixou-se na intemporalidade:
eu, que nunca havia escrito
paroxismo
marcaria encontro no ermo de um sonho
com a palavra repetida à exaustão.

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