Os gritos ululantes na selva infantil
desenham a inocência nas arcadas do
tempo.
Os petizes olham-se, ingénuos,
vociferam contra as prosápias adultas:
mandam-nos estudar;
mandam-nos comportar-se a preceito;
mandam-nos comer a sopa;
mandam-nos ser obedientes;
mandam-nos não quererem ser adultos
-
que adulta é uma idade tristonha.
Pegam nos livros:
atiram-nos para a lareira,
escondidos debaixo da lenha
para que ninguém os salve a tempo.
Pegam nos entediantes filmes
intelectuais,
os que as subtraem à televisão pueril,
são mandados janela fora em voos
aerodinâmicos.
Pegam nas plantas dentro das jarras
para as alimentarem com lixívia.
Vão à casa de banho,
não para satisfação de fisiológicas
necessidades,
mas para entupirem a sanita com um farto
bolo
de papel higiénico.
À noitinha,
quando as querem já mortiças,
preparadas para o sono que as descansa,
espreitam no quarto onde dois adultos
gemem,
só para os ver aflitos quando vêm que os estão
a ver.
As excrescências nasais
deixam-nas penduradas debaixo da cama.
Não gostam que a água se pegue ao corpo,
pelo menos com a frequência a que chamam
higiene,
e mentem (se preciso for) para ocultar o
banho por tomar.
E se lhes querem cortar as unhas
(porque as dizem encardidas)
protestam com gritos que os fazem salivar
de ira
e desistir da função.
São soberanas de elas mesmas,
as crianças,
e não querem os graúdos a dizer
o que devem ser
nem o que devem fazer
ou o que não podem asnear.
São arautos da felicidade que os crescidos
ignoram.
Por isso as invejam.
E por isso as massacram
com códigos de comportamento
com furiosas demandas
com proibições a eito.
Elas é que são o exemplo.
Da maneira como são
sem capitular
perante os freios dos que as conceberam.
Sem comentários:
Enviar um comentário