23.9.24

#3271

Deixa estar o futuro 

no lugar a que pertence.

22.9.24

#3270

O elixir dança 

nas veias embuçadas

destrona o vício da vida descendente.

21.9.24

#3269

As lágrimas chamam por um lenço enxuto 

as armas pedem um lençol desembargado.

20.9.24

Injustiças indocumentadas (433)

As pessoas 

fogem a sete pés, 

embora só tenham dois.

Injustiças indocumentadas (432)

amigos do peito; 

e do resto?

#3268

Não mandem 

os mastins ao dentista, 

precisamos da carne intacta.

19.9.24

Pétalas dançantes

Despejo o fogo perdido no coldre puído. 

As entranhas sacodem as orações avulsas. 

Não foi em vão o destino à míngua de bússola. 

O amanhecer irradia os rostos adiados. 

Alguns fazem-se adidos das esculturas perenes:

se pudessem também eram perenes;

se soubessem, antes ficassem como são. 

Os arruamentos são como muralhas;

escondem dos corsários as incontinentes misérias. 

Escondem-se envergonhadas pelo que não são. 

Fogem dos dias alumínios que roçam as arestas. 

A carne viva cuida das cicatrizes 

no provável silêncio. 

Não são a matéria apodrecida que dança 

no avesso das ondas. 

Não são o ciciar espectral que denomina o medo. 

O xisto endurecido é a cama para a fala continua. 

A encomenda dos pesares não precisa de procurador. 

Destemidas as almas que voam no sonho dos dias 

no lugar onde o medo se extinguiu 

e o arnês ficou vago.

Injustiças indocumentadas (431)

Há os que cantam 

e seus males espantam 

e os que cantam 

e em nós males semeiam.

#3267

A pedreira desbastada, 

um soro que foi dissolvente.

18.9.24

Anti manual de qualquer coisa

Não sei ser 

o emparedado busto 

que os senadores ditam 

além das sepulturas que os esperam.

 

Não sei dar 

palmas válidas

aos pavoneados escultores da fama 

sem ser por derruído abuso.

 

Não sei acolher 

as musas sem refrão 

que os engenheiros da opinião obrigam 

a não ser por profissional impostura.

#3266

Um meridiano, 

para não amornar 

os extremos.

17.9.24

Lupa

A pele suada corre para o precipício. 

Extasia-se, 

quando centelhas do dia corrompem a luz

e um diário se antecipa ao lugar dos deuses. 

Dizes

somos neutrais 

às profundezas em que se divide o mundo;

terrivelmente céticos

arranjamos o desmedo como modo de vida

em vez de sermos parturientes de achados

procuradores

das grandes teorias que simplificam o mundo,

as teorias que insultam o mundo

que sabemos ser incapaz de caber

em duas dúzias de palavras. 

Cobramos ao mar arrefecido

o alumínio que ferra a boca

a ossatura em que se fingem proezas;

anexamos apenas 

aqueles pequenos pedaços de pele

que ainda não tinham suado num beijo. 

E povoamos o dia 

com um copo de vinho

um poema indelével

a recordação de uma peça de teatro

toda a alquimia de que fomos autores

e toda aquela que os dias irascíveis saberão ter

por deixarmos 

em tatuada batuta mestra

as estrofes que dispensam fala

a amostra das palavras que colhem das árvores

as invisíveis armas a favor da indiferença. 

Injustiças indocumentadas (430)

Também

de conservadores de esquerda 

há notícia, 

habitam nos registos.

#3265

Hoje 

abraço uma janela 

que transige o luar.

16.9.24

Conta quilómetros

Despenteio o pensamento pesado

dou ao dia o desacontecimento grelhado

e na vetusta vitrine que viaja sobre o envelhecer

desato os pontos emaranhados

vírgulas em excesso avivando os vieses de outrora.

 

Vejo que não me valido nesses preparos

desejo que se deseja no desacato dos costumes

em sistemáticas perguntas que assimilam o saber 

em vez do harpejo que desarruma as lantejoulas

em equívocos acamados numa doca seca.

 

Vejo-me

na distância que há de mim aos lábios desalinhados

numa linha constante

desenhada por lídimos embaixadores

eles ou eu

no primeiro salto por cima do abismo

até encontrar 

as folhas desmatadas entre as mãos.

#3264

Deitam-se os faróis 

sobre a matéria válida do entendimento 

e nem assim 

a luz se abate sobre o dia timorato.

15.9.24

#3263

Somos muito dados aos ismos 

até nos tornarmos istas 

sem darmos conta das prisões

a que nos abraçamos. 

14.9.24

#3262

Na pose de abadessa 

com a pança opada 

de quem não se enfarta 

com o aroma do poder.

13.9.24

Injustiças indocumentadas (429)

Não dês a palavra 

que depois 

não ta devolvem.

Censo

Só de cedo ser

cego as certezas sábias

na seara onde sobra o sono

que pela certa sou incerto

e sondo os sinos assombrados

para ao serão soltar um seráfico sorriso

e ao sabor das sílabas

saber

o sabor incensado do saber

que não se encena.

#3261

O farol aceso 

mascara a noite 

com mil disfarces 

ao arrepio da mágoa.

12.9.24

#3260

Bebem pelas medalhas 

ufanos 

legitimamente,

antes não lhes vistam à força 

a bandeira.

11.9.24

Injustiças indocumentadas (428)

De um golpe alto

ninguém fala 

em protesto.

Injustiças indocumentadas (427)

Spin,

doctor.

#3259

No rebordo do dia 

o silêncio sobe 

ao veio dos sonhos.

10.9.24

Injustiças indocumentadas (426)

Na missa campal 

voaram salmos 

esgrimiram-se orações 

e as redenções andaram em saldo. 

#3258

Um cabresto 

para o gongórico 

a bem da humanidade.

9.9.24

Ambivalente

Um estorvo que não é daninho

a água fruída pelos lábios porosos

a caxemira que se entreteve nos dedos

o sobressalto herdado de um tempo remoto

os olhos lunares atravessados na estrada

a maré alta sem mastro onde hastear

as obras peregrinas que inventam a cidade.

Injustiças indocumentadas (425)

A sociedade está fraturada.

Abram alas aos ortopedistas.

#3257

Escoltas

sob o tédio exorcizado 

a maresia das palavras combustíveis.