28.11.13

Entrelaçados

As pagas não são juras.
Acantonam o tempo surdo.
Embelezam os braços suados.
Afiançam os desejos prometidos.
No deserto ou na mais agitada cidade.
Em todo o lado.
Em palavras adocicadas.
Na febre dos passos ouvidos.
Orquestradas nos beijos sibilinos.
Que dissolvem a sujidade das paredes.
Porque as juras não se pagam.

5.11.13

Vol d’oiseau

Visto do miradouro,
onde a paisagem é um distante nenúfar,
tudo é paradoxalmente detalhe.
Como se a miopia fosse ao contrário,
a distância curando de arranjar
lente hiperbólica.
Confirmando que a inspeção da proximidade
é nevoeiro atirado para cima da lucidez.
E confirmando a higiénica distância,
sabática purificadora que dita a,
talvez,
arrogante sobranceria do isolamento.
Desde o miradouro.

25.10.13

Binário

Ah!,
o sorriso largo dos fedelhos
em contramão com o rosto fechado
das velhas;
e, a uma mesa de café,
o tirocínio do mundo
em seu pulsar contraditório.

Prolegómenos

Exulta.
Exorta a tua exultação.
Exulta por seres livre de exortar.
E desembacia as palavras agrilhoadas
se não queres ser refém dos tiranetes
que amordaçam

exortações e exultações.

11.9.13

Depois da noite tempestuosa


Archotes incensados
vertem a luz que dantes era ausência.
Nas cinzas arqueadas no chão
a mácula de tempos abraseados.
Mas as cores reavivaram,
encontraram cais onde aportar.
Tudo se interroga.
Tudo, como se certezas fossem apenas
incógnitas.
Os sobressaltos contínuos estão extintos.
Ao acordar
por entre a penumbra caldeada pela luz fresca,
o querer inspecionar o mundo.
De o meter na palma da mão
e depois a abrir
e ele voar no amplexo da liberdade.
Na posse dos archotes em sua chama
jurando as preces que alindam
o inteiro mundo.

6.8.13

Post scriptum


A capa de gelo:
frontaria reluzente
onde o sol se aninha.
À noite,
quando o frio consome
as entranhas de tudo
e a lua adeja no firmamento,
as veias incandescem.
O lugar dos contrários refaz-se,
desafio.
Os olhos não se demitem.
As mãos ensopadas em suor,
dedilham no céu opaco
os esboços da alvorada devolvida.
Os amanhãs deixam de ser
uma espessa camada com sabor a nada.
O gelo transformou a hibernação
em quadro tingido a fogo.
Agora o doravante já não é pesadelo perene.

4.5.13

Oxalá


Sai do sangue
sem contudo pesar
a irradiação que alimenta o tempo.

Sai com o sangue
demora-se e contempla
o devir prometido que tarda.

E se for só com sangue
a custo tanto a que vêm os partos difíceis
será com o sangue assim derramado
que o entardecer do porvir
virá a seu tempo.

11.2.13

Páginas a soldo


Sabias os olhos furtivos
sabias os cais embaciados
sabias as mãos quentes
e sabias as bocas corajosas.

Lias as palavras macias
lias os mundos desconhecidos
lias os mistérios no nevoeiro
e lias os segredos no gorjear dos pássaros.

E não sabias se leras
ou se fora só a campânula dos sonhos.
Que importava se tudo o que contava
eram os contos segredados pela maresia?