O crepúsculo admite as primeiras estrelas.
A noite não demora.
No desmaio do pensamento
o rosto esquece-se da sua silhueta
quando o espelho o devolve
e não pressinto ser o rosto meu.
Não há problema.
Todos temos esquecimentos.
Imagino os esquecimentos futuros
como se estivesse na dobra dos tempos
e o vindouro fosse meu achaque.
Não é o caso.
Não posso estar mais desinteressado
sobre os corredores estreitos
do tempo futuro.
Tenho-me numa encruzilhada
de que não sou capaz de definir os contornos.
É esta soturna impaciência que me tolhe.
Espero a noite de véspera
cansado antes do tempo
cansado logo que a noite se anuncia
cansado aos primeiros vestígios da noite.
Lembro páginas avulsas
enquanto combato a tirania do porvir.
Se ao menos o tempo se esvaziasse,
se fosse reduzido a um invólucro,
exterior,
fosse legítima a espera,
o sentido da vida,
e os sobressaltos se amputassem
pela simetria perfeita dos novos tempos
– dos tempos sem tempo.
Combino com a consciência
o redesenho das costuras que me limitam.
Não faço promessas.
Não me empenho a juras fátuas.
Não sei o segredo.
Porque entendi que os segredos
são uma miragem
e por dentro da miríade de palavras que contam
segredo passou a palavra extinta.
O entardecer ultrapassou-me
e agora já tenho a noite por palco.
Não há problema.
A noite não é imorredoira.