O dedo mindinho
como metáfora da adivinhação
é a revolta dos pequenos
a revolução
sem inventário nos compêndios.
Refúgio nas palavras. A melodia perdida. Libertação. Paulo Vila Maior
O dedo mindinho
como metáfora da adivinhação
é a revolta dos pequenos
a revolução
sem inventário nos compêndios.
Dizias
que o peito se enche de alma
quando a noite se disfarça
de um verbo que não esconde
o desejo.
Dizias
com o olhar desembaraçado
que as palavras emprestam o sal
que se tornou rarefeito
neste lugar composto por gente meã
neste lugar
onde todos calçam as galochas do videirinho
e afocinham no juízo sumário
à custa de ordenanças gozadas por preconceito.
Dizias
como se fosse preciso fazê-lo
que lugares destes são poços inválidos
cidades órfãs de mapa
idiomas que põem as pessoas a desentenderem-se.
Dizias
que estás cansado deste desentendimento
que toma partido dos vãos
e que extinguem os voos largos
que asas decepadas não deixam embainhar.
Cada um devia ter o direito
à revisão constitucional
e isso devia fazer parte
da revisão constitucional.
Registo a patente
antes
que a preguiça me tente
e em brancos dentes
se afogueie um tenente.
Vejo com desdém as pontes
e arrumo
antes que tu os contes
os anéis que cuido com aprumo
no balcão que guarda os dotes.
Das mãos verto este sumo
alteroso
e remedeio sem medo do fumo
o miado medroso
a que não me acostumo.
Os espanhóis
precisam de quem lhes faça
desenhos
no pecúlio da gramática;
de outro modo
não teriam
pontos de exclamação
e pontos de interrogação
a prefaciar as frases.
Afinal
o elefante esteve
este tempo todo
no jardim zoológico.
Injustas foram as injunções
sobre o seu parco estatuto diplomático
em metáfora que mexia
com porcelanas de fino calibre
e salões onde solenes salamaleques
decorriam a preceito
– os senhores
pressurosamente
desfazendo-se em cortesias hipócritas
e as senhoras
contrafeitas
reprimindo fantasias nas ameias da mente.
Ao elefante
vítima de injustificada injustiça
devia ser reconhecido o direito de reparação
que hoje quadra tanto com os modismos
que às vítimas de outrora
assiste a reposição da justiça a seu favor
para que possam descansar
no sossego da consciência dos outros.
O mundo inteiro
(concessão ao rigor:
o mundo quase inteiro
que não se impetra o consenso forçado
tão próprio de um centralismo democrático
de má memória)
devia saldar uma interrogação:
como foi possível
passar tanto tempo agrilhoado
à metáfora do elefante na loja de porcelanas
se o elefante
tão paquidérmica criatura
nem sequer cabia na loja?
Ninguém
dera conta
que o elefante
não tinha saído do jardim zoológico.
É o superlativo embate
na onda que se agiganta
desde o magma lancinante:
nada se oferece em vão
e os mármores sublimam
uma opulência que é disfarce.
Nas mangas da incerteza
gravitam as constelações sem freio
e os pés que sentem a falta de chão
não se desordenam
não encaixam no caos aparente.
Deixem-nos à sua sorte
que eles
sabem procurá-la.
Sexto sentido:
as covas da estrada
desamortecem os contratempos
em que se prevê o tempo por andar.
Vão as janelas, os contemporâneos:
assustam as nuvens malvadas
que fazem coro com a tempestade,
sabem que forte é a sua têmpera
quando porfiam contra o mar levantado.
O corte válido
é aquele que resgata os sentidos
que nunca chegam a ser velhos.
Se o fuso horário não enganar
e o rio arrematar a nostalgia dos forasteiros
das barcas trôpegas desembarca
uma gesta de virtuosos,
aqueles que trazem no bolso
resposta afivelada para qualquer pergunta.
O miradouro tira as teimas:
no lugarejo conhecido como mentira
desaprovam-se todas as palavras.
Mal se desencanta um lugar assim
que toma as dúvidas por mentiras
e isenta de culpa as mentiras que o são,
legítimas.
Do sol
até ao sul
do sono sanado
em vez do sal segado.
O sabre
sobre o santuário
sinaliza o sábio
servido de sentinela.
O sal servido
singra o sono sagaz
que no Sul
se sagra no solstício.
Ninguém desiste da luz diurna
enquanto pelo crepúsculo não for vencido.
Jogam-se as peças todas
no tabuleiro onde se atravessam
as possibilidades infinitas.
O conhecimento não chega à fala
com muitas delas.
O periscópio lança-se sobre a âncora distante
o despojamento titula a ousadia.
Os braços desembaraçados
nivelam-se pela estatura do Olimpo.
Num momento
as peças espalhadas pelo chão
disfarçam o inanimado:
querem que todos saibam
que são uma possibilidade
que se joga na aritmética das possibilidades
uma equação emancipada da órbita do criador
os números em vertiginosa roda-viva,
um deles à espera de lugar
na lotaria incandescente que afogueia o dia.
No clandestino amplexo das possibilidades
uma sai do avesso da coorte
e contraria a maré a preceito.
Antes que,
do antebraço das possibilidades,
muitas sejam extintas
e o mapa delas se reduza a um ermo.