9.8.23

Quase claridade

Ólafur Arnalds, “Near Light” (Living Room Songs), in https://www.youtube.com/watch?v=UHVh_L_kv1Q


Deito-me na lava que deixei à minha frente

os corsários que avulsos intimidam o sono

trovejam as pedras atiradas sobre as abóbadas

e de mim não sei se não a constelação inaugural

uma boca extintor servida nos melhores banquetes

braços e pernas presidentes

pendidas como tentáculos

generosamente

o melhor do pior

antítese.

 

Confiro a métrica dos medos deixada em rodapé

convoco a audácia dos demónios

entre marés providenciais e páginas esquecidas

desdobrando as fotografias sonolentas

o lume da manhã arrefecendo a carne acordada

o sufoco das tempestades sem bainha

desde o miradouro hasteado

até ao aqueduto dos cruzados.

 

Dou-me inteiro à tua posse

e tu

a sereia que arranca os versos

à minha boca prodigiosa

contemplas a rebeldia dos insubmissos

como sabes de cor cada centímetro de pele

e eu

sem pressa do passado

arremato dos leilões sem paradeiro

a argamassa onde tudo se ampara

onde tudo se compõe 

na efémera câmara transparente

no friso puído que soletra de cor

o magma inquieto

que não tarda

é musicado em lava incandescente.

 

Para dizermos então

que os dicionários correm no sangue

e toda a literatura se escondeu

nos poros da pele que irradia o luar cessante

em furnas vertiginosas fugindo do crepúsculo

caiadas nos braços centrípetos da árvore-favor.

 

Deixo a lava onde me sentei futuramente

o sumo da lima vertido na pele cicatrizada

e sei que da lava que lavou a alma 

agora acrisolada

agora

nesse preparo que é um tempo dedicado

morada em que à tua, maior, alma

se ofereceu.

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