De um punhado de areia
a janela ampla sobre a varanda
e à maré fui roubar a ternura das mãos
levedura do peito cheio onde repousas.
Dei-te a chave
o rosto frio à espera da boca
os lábios que eram sôfregos mastins do desejo.
O meu corpo
a página interminável em que te demoravas.
Dizias:
“não precisamos
de conjugar o verbo no passado.”
E eu concordava,
concordava
que haveríamos de inventar um tempo verbal
na semântica que fosse rima nossa
e à janela voltaríamos
só para pesar as ondas do mar
e contarmos os gramas de sal
de que era feita a maré
e à lua tardia
encomendarmos a gramática sem critério
o estuário onde andaríamos de mão dada
ocupando o leito todo
sem espaço para o demais.
A varanda
vertida sobre a janela ampla
cobra o preço da areia a rodos
– e já empregamos o verbo no presente –
e sabemos
com a inteireza do sangue convincente
que de nós procedem as orquídeas avençadas
o poema salvífico
o nutriente incalculável
o salvo-conduto do instinto sem freio
maresia em sonhos petrificados.
Pressentindo a aurora
o altar da consagração dos amantes.