Estimada coligação de couraças:
a sobrevivência da cidade
agradece.
Refúgio nas palavras. A melodia perdida. Libertação. Paulo Vila Maior
Aprendi com esta árvore (que nacionalizei para proveito próprio) como se pode ser uma metáfora sem perder a arrumação das ideias. A árvore soube ser centrípeta, um passaporte para identidades sem paradeiro. A cor lampejante das suas flores (mas efémera: dura junho) tomou conta do sangue que me transporta. O meu grupo sanguíneo são aquelas flores.
Como se fosse um delta
todas as ramificações
cintadas a um labirinto ousado
e tudo esbarra
numa constelação de dúvidas
descarnado desde a raiz
até à madrugada gentil,
uma embocadura que ganha estuário.
Dita o fogo ateado na carne
o modo de sobrevivência
(e não se fale em sobrevivência por acaso,
se é um estado acima da vida).
Ontem
dizia-se que dantes
é que era bom
e-não-sei-que-demais-lamúrias
mas isso era
porque nada era o que se sabia
sobre o futuro.
O fogo que se promete
é em piras futuras
e aquele há demandado
agonia no caudal das memórias
a funda espada
que dilacera o que sobra
do frescor que se esvai.
E não se prometam elixires
que disfarçam a madurez
ou a farsa da decadência emulsionada
a menos
que as ilusões
sejam o império por diante.
Somos os escultores
em que tremeluz a fala
os dedos húmidos limpando as arestas
e as estrofes militantemente anónimas
contra o sequestro encenado pelos mastins.
Em boa verdade – diz-se;
sem enunciar as diferenças
entre uma boa verdade
e uma verdade simplória.
Lágrimas exaustas cobrem o rosto da angústia.
O dia é um sacrifício.
As pontes quebradas
não entram no condomínio da alma
despovoam as margens
deixadas a esmo na noite testemunha.
Feitiços inviáveis emparedam o sono
e o silêncio entranha-se no sangue,
nos ossos
à espera de se tornar a gramática imperativa
destronam a fala
em sucessivos golpes de solidão.
Podia ser um dia de tempestade
mas não passa de fingimento
a tempestade enquanto metáfora
ditando a convulsão insubmissa que agita
até os vulcões adormecidos.
Podia ao menos
ser um dia testemunha.
A angústia podia ser timorata
faça-se a encomenda
aos procuradores das intendências;
se não for para passar pela casa da partida
os terramotos crepusculares afeiçoam a carne
e tudo por dentro se subleva
subindo
ao promontório sempre ocupado pelo nevoeiro.
Oxalá fosse o suor
a percorrer as avenidas gastas
as sílabas encontrassem o seu tempo
e a agonia fosse a geografia dos outros.
Até cantar em coro com as aves na sua migração
e nelas saber o regaço
a petição do exílio.
Se nem por dentro dos sonhos
somos miragem
se nem na coutada da noite
bebemos da árvore centrípeta
se nem no luar ornamentado
subimos os degraus da maresia
se nem no coaxar das rãs
participamos na insónia;
se é no ousado dissidir
que somos
nomes inteiros
matéria vulcânica ateada
braços de cepa audaz
noite sem vultos a adejar
os ramos frondosos de uma praia
enseada a aprender a falar o futuro
– combine-se a procuração contra os agiotas
que não é de medo que se assanham as bocas
nem de uma alma venal aos olhos de suseranos
que falam as estrofes de titânio.
Os anjos não têm costas.
E essa
é a definição de incapacidade ao quadrado.
O vulcão líquido atravessa os ossos
fica com um quinhão
que amedronta os sismos qualificados
e em equações sem propósito joga-se o belo
jogam
os anfitriões que mostram as sílabas do pecado.
São os despojos que confecionam as paredes
sem que da estultícia dos sacerdotes
recolham as baias dos costumes.
Se não for pelas espadas argutas
que seja através dos colóquios
onde se antecipam os títeres doravante.
Todos mostram as mãos
como se houvesse um mandado do tribunal
e as curvas retorcidas fossem prova dos párias.
Não interessa.
Todos combinaram
em silêncio
que as mãos ficam prostradas
assim como quem finge não saber o idioma
ou não ter faculdades mentais.
Às vezes
o húmus referencial subleva-se
e nem o odor pestilento
cobra as dívidas futuras
nem as sereias amestradas
coabitam com as fontes agelastas.
A flor bela
devora
a flor bala.
Antes fosse
a flor bola
lamenta a flora bala
quase a cair na boca
da flor bela.
Tudo
sob os auspícios
da flor bula.
Atravessam as cores
atravessam os vulcões
com os nomes ensandecidos
com os olhos assestados no futuro.
De um nome não se diga
indiferença.
De um nome
sejam rasurados os poros
em manhãs ausentes,
a diligência dos arrependidos.
De um nome
fugido à escravatura
urdindo os verbos crepusculares
enquanto se amacia o verbo do porvir.
Dos nomes se digam
bem alto
as clepsidras luminosas
o verbo oponente num horizonte sem freios
os nomes
inteiros ou pela fração que calhar
em sucessivas marés sem algemas
os nomes que chamam por nomes
antes que sobre eles caia
o silêncio.