20.6.23

Motor de combustão

Lágrimas exaustas cobrem o rosto da angústia. 

O dia é um sacrifício. 

As pontes quebradas 

não entram no condomínio da alma

despovoam as margens

deixadas a esmo na noite testemunha. 

Feitiços inviáveis emparedam o sono

e o silêncio entranha-se no sangue, 

nos ossos

à espera de se tornar a gramática imperativa

destronam a fala 

em sucessivos golpes de solidão. 

Podia ser um dia de tempestade

mas não passa de fingimento

a tempestade enquanto metáfora

ditando a convulsão insubmissa que agita

até os vulcões adormecidos.

Podia ao menos

ser um dia testemunha. 

A angústia podia ser timorata

faça-se a encomenda 

aos procuradores das intendências;

se não for para passar pela casa da partida

os terramotos crepusculares afeiçoam a carne

e tudo por dentro se subleva

subindo 

ao promontório sempre ocupado pelo nevoeiro. 

Oxalá fosse o suor 

a percorrer as avenidas gastas

as sílabas encontrassem o seu tempo

e a agonia fosse a geografia dos outros. 

Até cantar em coro com as aves na sua migração 

e nelas saber o regaço

a petição do exílio. 

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