2.6.23

Valsa do peregrino

Um peregrino

 

(parecia um peregrino,

ou talvez fosse um mendigo)

 

avança devagar

apoiado na estrada.

Arruma com os pés as flores 

deixadas em bandeja no chão

como se o chão tivesse suplicado

um tapete aromático.

O peregrino

ajeita os andrajos

 

(seria um mendigo?)

 

e murmura

com ar de poucos amigos

o que ninguém consegue retirar

ao silêncio.

O peregrino

participa a solidão:

há quanto tempo

não fala com pessoas?

e esta interrogação

arbitrária como a suposição

só é válida para quem a formula.

Ninguém pode dizer ao certo

o que vai por dentro do peregrino

 

(e também não por dentro do mendigo).

 

A fivela à cintura descaiu

e o peregrino acerta-a:

não quer ficar

com as calças na mão,

o mendigo

 

(ou será o peregrino?).

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