Um vago rumor nos bastidores
a melancólica nuvem a descer do passado
e um estirador à espera de intenção.
Refúgio nas palavras. A melodia perdida. Libertação. Paulo Vila Maior
Um vago rumor nos bastidores
a melancólica nuvem a descer do passado
e um estirador à espera de intenção.
O fogo que arrefece o labirinto
o revés assimilado no alfobre dos embaixadores
a litania que corre atrás das falas excessivas
a espuma escondida atrás dos néones
os nomes exaustos que moram no cais
os rostos emudecidos na solidão imprevista
as saias a fazerem de cortinas
o palco esburacado onde só mora o escol
as baionetas descontinuadas por medo do futuro
um leve beijo que acetina a pele
a prole devida em abundantes presunções
o leito cabal à procura de cabimento
o cabaz sem nome que ensaia o exílio
a amadurecida combustão sem espera
os tiranetes depostos em ato sem impugnação
a memória resguardada dos segredos embaciados.
Do espelho
estilhaços avulsos
a mudez invernal
a súplica de um luar.
Os braços
avalistas das bandeiras
arremetem contra a sisudez
dicionários dos dias sem sombra.
As montanhas
silhueta capaz
ensinam a lucidez
a peregrinos da altivez.
Rejeitados
os demónios extravagantes
emudecem por dentro
apaga-se a chama dantes temida.
O amanhecer
verbo nunca gasto de simplicidade
amarrota os rostos estremunhados
desanunciando os tradutores do desassossego.
Esbraceja o ódio antes que seja futuro
dá-o como património de colóquios
manifestos vários em forma de arte
fantasmas sopesados com o jugo cirúrgico
de quem fabrica oráculos.
Sê tu o agente que fermenta o ódio
o desambientado embaixador de radicais
o desbocado comparador de Histórias sem igual.
E depois
quando a profecia que
(parece)
queres revelada
tiver aquiescência pela mesa de voto
não digas que te esqueceste de forjar
tão profana profecia.
Remexes a areia
com as mãos molhadas
participas no esconderijo
onde as coisas são a sua negação.
O sol espreita entre as rugas
enxuga as lágrimas amanhecidas
no leito insistente do nevoeiro.
Os olhos crepusculares
decantam a luz agitada
traduzem sílaba por sílaba
o sortilégio animado
pelas falas que despontam.
As asas de um anjo
esbracejam as rimas
e adiam a solidão:
por cada adeus soletrado
fica uma dívida por abater.
Ainda está por determinar
qual das duas é a segunda mão
para se estabelecer
que é inferior à primeira.
Desmata os rumores que fogem da conta.
O ruído é um pano de fundo escusado.
Uma espada que trespassa a lucidez.
No inverno do desespero
onde não congelam os males artesanais
e a ciclópica tentação pela usura
remexe na terra com as mãos nuas
e descobre
como quem ganha uma medalha
a recompensa sem preço:
as palavras
não são murmuradas
porque não escondem segredos.
Arrancados os rumores pela raiz
não há conspirações que se instalem.
Talvez
havendo juízo só em saldos
seja possível a lucidez sem arestas
um tempo amovível dissolvido entre as nuvens
o desembaraço que dispensa planos
o retrato inteiro de rostos escondidos uns
disfarçados outros
da vergonha empunhada em nome próprio
uma espécie de unidos estados outrora divorciados
o navegar em doca seca
e acreditar
com o cimento próprio das fés religiosas
que se foi tribuno de façanhas singulares.
E depois
com o entardecer
hastear os violinos estonteantes
mesmo os que têm cordas rombas
e partir como se fosse marinheiro
partir
com o travo doce de quem sai à aventura
sem mapa nas mãos nem corda sobre o tempo
apenas irremediavelmente náufrago
em lugares de que nem depois há existência.
Os estilhaços vitalícios
secretamente escondidos no húmus
fortificam a pele rosácea
vacinada
contra os obséquios de loucos e profetas.
Descontam os balcões puídos
a fala desarticulada
que voluteia como um pêndulo mecânico
sempre à procura de presas
fáceis.
Os ardis consequentes
descontentam as almas purificadas
os embaixadores das virtudes:
pois das virtudes
diz o cancioneiro
que se estilhaçam no vitalício fingimento
em que se orquestram
os dias seguidos.
O corsário devolve a espada
no estuário onde naufragou o dia.
Vence o sono
contra as previsões
do pesadelo que tomou conta da noite
e respira no cachaço do dia
empresta-lhe o ânimo
a desmentir a previsão de funeral.
O corsário
deposto do seu posto
vestiu farda civil
e agora não se distingue
dos piratas disfarçados.
Abriga-te na lotaria sem paradeiro
não é a sorte que demandas
apenas uma varanda
onde possas respirar a gramática do avesso.
E ainda que as probabilidades
Estejam contra ti
não o tomes por conspiração
o mundo tem outras pendências urgentes.
Na lotaria dos párias
onde julgas habitar
és enjeitado
por excesso de virtudes.
Quem te manda ser
ó castiço
um castiçal de probidade
um autêntico desexemplo cultivado
na litania dos paradigmas prístinos?
Detidos os farsantes em serviço
ficou uma sensação de maré-baixa
aquele odor a latrina
impróprio para consumo
mas próprio dos lugares soezes.
Valha-nos
o vinho licoroso
as páginas cheias de mácula
e o pecado sistemático e impudico.
Estamos entregues à bicharada
e isso valeu-nos uma queixa no tribunal
por antropocentrismo.