Diziam do lavagante
o mesmo que (do preço) do ouro,
depois de despida a armadura.
Refúgio nas palavras. A melodia perdida. Libertação. Paulo Vila Maior
Os pais das tempestades 
são aqueles que as batizam 
com nome de gente.
Assobiavam
todos aperaltados
os embaixadores enfatuados
o idioma franco balbuciado
à medida dos vermutes bebericados.
Apareceu uma quadrilha
a caminho de um assalto.
Ficaram todos
(embaixadores e meliantes)
com o movimento entre parêntesis.
Caiu uma chuvada torrencial
e todos se refugiaram 
numa paragem do autocarro.
Horas depois
um dos meliantes deu pela falta
de uns diamantes desviados ao legítimo.
Lembrou-se
do estalão da divina justiça
e de um perdão de mil anos
amaldiçoando a chuva que torrencial
caiu.
Continência ao general
que o general é incontinente.
Potência ao general
que o general é impotente.
Pela hora da morte.
Pela 
a hora da morte.
Apela à hora 
da morte.
Há hora da morte.
Corsários que deixam o mar suado
cruzados que sobem as árvores imodestas
sacerdotes que sepultam o pecado
artesãos descuidados com o véu lúcido
eruditos a estagiar numa taberna viciosa
beligerantes castrados nas desoras da vida
aspirantes demitidos no ato
cozinheiros que devolvem segredos ao mar
procuradores sem mandato desovado
mecenas sem latitude material
tiranetes condenados à solidão
cúmplices adestrados no contorcionismo
estetas mergulhados na feiura
vozes que se servem do silêncio
boémios extasiados com a manhã baça
mendigos amesendados em hotéis superiores
capitalistas a provarem a suína fatiota
ácaros militantes que dispensam o labor
treinadores de almas que empenham o unto réptil 
distraídos a beberem o dia pelo artelho da bota
primeiros-ministros que parecem quintos
rececionistas que mendigam bondade
avarentos que escondem gorjetas puídas
sonhadores que apanham um avião intercontinental
generais que fazem a incontinência.
Que acordamos dizer
na estiva da maré 
– que palavras 
juntamos com as mãos
à servidão de que nos isentamos?
Dei sementes ao lago furtivo
os nenúfares atravessavam a margem
e do idílico fazia novelos em forma de luar. 
De cada vez que o cimento pedia corda
regressava aos atávicos humores
os costumes esconjurados 
em meia página de sono. 
Depois
em aldeolas erráticas
subia o pulso fraco e fazia-me cordilheira
um anjo sem coroa nem domínio
fogo haurido no pedestal das vozes híbridas. 
Se não pudesse saber a manhã das palavras
fugia de mim por dentro da carne tingida
o dorso curvado nas escadas desarrumadas
como se em bocejos se contivessem 
as juras que dão cor ao mundo. 
Todavia
as bandeiras avulsas sossegavam a mentira:
era preciso contar mentiras
até às próprias mentiras
em nome próprio ou na procuração arregaçada
para que ninguém fique em detrimento
para que ninguém
ficasse em dívida à mentira
e ela seja o trono que a todos democratiza. 
Não se foge da penumbra altiva
os estilhaços advertem os sobressaltos 
em contínuo
na miragem das palavras acertadas:
desenganem-se
os colonos do amanhã
os feitores de quimeras por empunhar
os embaixadores do obsoleto
os párias que perderam povoamento:
o amanhã espera a conjugação atempada
e será a vez dos apocalipses verem desmentida
a data.
Em vez de sermos 
exílio por fora. 
Antes de sermos 
matéria puída 
no avesso do tempo. 
A tempo de sermos 
alguém
depois dos fantasmas.
É este o desatino
que me alicerça
este
o destino
em forma de barca
por onde me retiro
do abismo convocado. 
Este
o areal tingido 
pelos vultos dos náufragos
o imaterial testemunho
de uma vida vindoura. 
É neste mar
que me antecipo
ao passado
em esgrima com o grotesco
o arsenal sem marca 
que merca as cicatrizes 
embalsamadas. 
Este 
o mar minha morada
o largo espelho de vozes
um sufrágio inteiro de equívocos
o arrependimento disfarçado.
Um favor
aos militantes do não casamento:
desposar é fronteiro a despojar.
Arrumo os lençóis da angústia
na mortalha deduzida 
ao penhor da razão. 
Assimilo as vontades que se angariam
o salvo-conduto alistado 
nas desoras do medo. 
Os poucos remédios acreditados
erram nas estantes empoeiradas. 
Não são as poções diligentes 
que amadrinham no peito preparado 
para dias amuralhados. 
Aos hinos histriónicos
dou de oferta tiros certeiros
vou ao coldre 
com a pressa de matar mitos. 
Este é o vício manancial
um querer sobreposto ao medo
calendário visível por dentro da fornalha
infernal
e a boca insilenciável 
que investe contra as vendas
ela própria invendável
insaciável. 
De toda esta fome
uma boca hasteada 
desenha a cordilheira 
a abóbada onde os segredos 
sabem da guarida contra as cicatrizes.
Virtudes eclipsadas:
protestava o elitista
com o consentimento 
do moralista incorrigível,
que de pantanas está o mundo
e já não têm serventia
as preces encomendadas 
aos druidas habituais. 
O monárquico afoga-se nos prantos
enquanto emagrece no saudosismo
o boçal já não acredita
que as mulheres tenham direitos
(ou, vá lá, um leve direito ao orgasmo)
o latifundiário todavia falido
lamenta que queiram banir as touradas
o reacionário beócio levanta estandartes
contra os prevaricadores que sopram a poeira
o beato condói-se só de supor
que se fornica desalmadamente 
por este mundo
dentro. 
Em movimento paralelo
o ilustre intelectual força consensos
sob a capa ultrajante do único pensamento
(que jura abjurar)
o profeta de futuros apocalipses
embebeda-se 
porque o mundo já devia ter acabado
o erudito continua convencido
que deve ser um pastor das iletradas massas
(cansou-se de genuflexões arcaicas)
o pastor social
dependem de um rebanho para apascentar
a ditar imperativos categóricos
enquanto enche a boca de democracia
e engana os tolos com papas
e um jovem precocemente militante
convencido que é lente dos mais velhos
arrota postas de moralidade.