18.12.23

Injustiças indocumentadas (268)

Passaporte.

Passa porte.

Passa (o) porte.

Passa (o teu) porte.

Parte.

Injustiças indocumentadas (267)

Aceita a seita.

A seita aceita.

Aceita.

A seita.

Injustiças indocumentadas (266)

Não se brinca

com cadeiras.

 

[Prontuário do blasé]

#2999

A ponte é uma dádiva

um atalho entre duas mãos

a muralha desfeita no pó do tempo.

17.12.23

#2998

Wait

for the weight.

Weight

the wait.

A premissa do sonho

O pensamento faz barulho

onde o corpo se esconde

quando a matéria anoitece.

O pensamento faz barulho

onde se encontra com o silêncio

quando as mãos estrénuas

esconjuram as vozes fraquejadas.

Quando

esquartejada a angústia

em finas camadas de frio

amanhecem as luas antigas

sobre o pano desarrumado dos sonhos.

A bucólica boca bebe de um trago

toda a baba dos pesadelos arqueados.

Tece os socalcos que descem

até sobrarem os silêncio ungidos

por deuses demissionários.

Mas o pensamento

continua a fazer barulho

até onde é ermo o lugar.

E esse

é todo o património

da humanidade.

Injustiças indocumentadas (265)

Conversa fiada

sem uma roca

por perto.

16.12.23

Injustiças indocumentadas (264)

Primeiro,

ministro.

Segundo,

vítima.

 

[Como reabilitar uma carreira política em meia dúzia de páginas]

#2997

Este é o nosso arras:

um património de palavras

o passado que nos persegue.

15.12.23

Injustiças indocumentadas (263)

Ave

deixa a Maria

pesar

a sua graça.

Injustiças indocumentadas (262)

O mundo anda estranhamente modesto:

tem os Países Baixos

mas faltam

os países altos.

Injustiças indocumentadas (261)

Para contar as favas

é preciso um ábaco 

em forma de milagre.

Injustiças indocumentadas (260)

Quem lambe botas

fala língua de trapos.

#2996

No fundo

ao fundo

o entardecer

militante.

14.12.23

Desmontagem

Os corpos esbracejam

multidões ansiosas por um aval

os seus abusivos xailes cobrem o silêncio. 

 

Não há quem desmate a floresta sem luar

não há ninguém no arrumado altar das fugas

e os bardos já não têm repertório

vencendo, enfim, 

o silêncio. 

 

Os cálices maduros sobem às bocas. 

 

Desaprenderam a nostalgia

e agora 

saciados

compõem as fragas por se despenha o medo. 

 

Sem céu por abrir ao luar

sobra a meada de neve

o longo apeadeiro onde se consomem as almas

no vindouro espelho que espartilha o passado. 

 

O ontem 

deixou uma amálgama retorcida

nomes e lugares e rostos e casas

embaraços tenentes da matéria puída

toda uma constelação de lúgubres lugares

à espera de lugar

na sepultura.

Outono erudito

À gramática do Outono:

as folhas desmaiam

juram que voltam a ser vulcões.

Deixam nuas as árvores

remexidas pelo Inverno impetuoso.

Não há nada mais inteligente

do que o Outono.

#2995

Estas espadas castradas

o ânimo enfim

um Homem fecundo.

13.12.23

Prisoner’s dilemma

Facing authority.

 

Fencing authority.

Injustiças indocumentadas (259)

Subsídios

para o conceito

de mentira despegada:

_____________________

Injustiças indocumentadas (258)

Fugir à verdade

para 

fugir da verdade.

Para

de fugir

à verdade.

Injustiças indocumentadas (257)

Fazer face

é uma atividade

que consome muitas calorias.

#2994

O desejo 

afirma o beijo

a vontade

num lampejo.

12.12.23

Nostalgia disfarçada

Mando no precipício:

não são os avestruzes vetustos,

os cicerones dos campos minados,

deduzem

que serão maltrapilhas as cabeças

assim encestadas na toca 

onde desamanhece o lobo censitário. 

Se por precipício se entender 

a mando de uma metáfora

acendem-se as sirenes

cimentando o sonoro protesto

tirado à prova dos nove entretanto. 

Se forem contumazes

os boémios adestrados

seja dada corda à cantilena arcaica

montadas as memórias altivas

o autêntico sublinhado da melancolia. 

Não é por erro

a carta da melancolia que sobe à mesa:

podiam os desalentados do presente

abrilhantar a nostalgia

tudo o que conseguiram

foi três pétalas de melancolia

no sopé do precipício 

que tinha ares de miradouro.

 

O dia diuturno

As mãos 

tocam a carne suada, 

levam à boca 

a alvorada 

que torna o dia opulento. 

Na coreografia sem roteiro, 

os corpos ensaiam o auge. 

Agarram-se 

aos dedos máximos 

que devolvem 

a claridade anestesiada. 

Se as paredes soubessem, 

eram poetas.

#2993

As palavras queridas

as palavras dinamite

as palavras elefante

as palavras devolvidas.

Injustiças indocumentadas (256)

Dois dedos de conversa

e os demais para o silêncio.

11.12.23

Antibiótico

Se o fundo for o magma

e as fruteiras colhem a madurez

os rostos cerrados proveem o adiamento

e do luar apeado não houver regime

as jornadas serão curadorias das bocas sedentas

o calendário previsível

ou apenas o vinho rasteiro ante dois dedos

de conversa.

#2992

A tecnologia das hipóteses

em vez 

de imperativos categóricos.

Injustiças indocumentadas (255)

A iluminação

dos combustíveis fósseis 

– parece mesmo que disse 

a repórter na televisão.

10.12.23

#2991

A mudez

servida pelo dia

por cima 

das vozes merencórias,

um achado.