Usa a escotilha
para guardar os segredos.
Refúgio nas palavras. A melodia perdida. Libertação. Paulo Vila Maior
O sangue do vulcão
esperneia
às costas do medo.
As feridas
são o penso da loucura
sobre elas pesam
as fundações do passado.
No viés da maré
contam-se as palavras turvas
o imenso lamento por esgotar.
E o vulcão em sangue
desce
antes que o tempo tenha paridade
sua é a sede do mar furtivo.
A pele suada foge da noite
na peugada dos sonhos de autor.
Não se espere muito dos dados
à conta de sortilégios
a boca emudece
no provérbio venal.
Falam
as pessoas que saíram à rua
falam como se houvesse
quem as quisesse mudas:
não se sabe o que dizem
mas também não importa.
O sangue do vulcão
cicatriza sob os auspícios
do mar
agora sobram as tatuagens
para memória futura.
As forças vivas da cidade
eram aquelas
que não tinham o cemitério
como residência.
É quando apetece
recuar à meninice
só para sentir
por fingido que fosse
que o mundo
lá fora
se cinge
às imediações
de mim mesmo.
Por cada lampejo de vaidade
a inflação dos seres acompanhava
os estouvados.
As mãos escorregavam no abismo
e as sílabas voavam mais depressa
que a fala.
Antes que fosse noite
folheava as páginas da véspera
à procura de perguntas.
Por muito que suspeitasse
a reparação da pele
antecipava-se à mentira.
Este era um lugar hospitaleiro
um feixe de portas abertas
à prova de espantalhos.
Se as almas tivessem asas
eram de toda a parte
ao acaso.
Está tudo pela hora da morte.
E qual é a hora
a que a morte se faz anunciar?
As rugas
desenham a assimetria do tempo.
São como cicatrizes dos sismos havidos
fraturas dantes expostas
traduzidas para tatuagens salientes.
As rugas
não falam pelo tempo pretérito
só falam no presente cheio de melancolia;
ou então
no terrível desamparo do tempo urgente:
nem sequer há tempo
para o olhar se deter no espelho
e cortejar as rugas que não escondem
a antiguidade.
As rugas
emprestam um consolo subvencionado
admitem no portal do tempo
a sua usura com os corpos.
Não é por conta de milagres
que são adiadas na nomenclatura
da idade.
São como catedrais:
credoras de estatuto
no cansaço do corpo compensado
pela lucidez montada na sela da quietude.
Alvíssaras
das boas
daquelas com o baixo patrocínio
de uma alta patente
ilegível
com o beneplácito dos que usam cabeção
– nunca se desprezem as cabeças à solta
e o erário privado
e as desengonçadas danças
de imprevidentes aprendentes.
Que sejam roídas as unhas
mas sem ser de inveja:
antes
um opúsculo impecavelmente encadernado
do que um vinho do Porto de olhos em bico
(se me é consentida
a expressão talvez levemente racista,
mas em todo o caso
protetora da DOP respetiva
– costelas durienses noblesse oblige).
Antes
a chave perdida
ou a fechadura por abrir
um druida ancião
na posse de segredos de Estado
do outro putativo,
sósia do seu tutor em fala e raciocínio,
aspirante a nivelar por baixo
ou um mediador de seguros
desamado até por filisteus correligionários.
Os que estiverem virados para esta moda
montem-se em tamancos:
muita será a água metida
sem submarinos por perto
um bibe para aparar a baba
ou uma cautela para amparar desditas.
Antes o simulacro
de uma Torre Eiffel
“tipo”.
Um t comprido
estiolado no entardecer
com as sílabas encostadas
e o vinho fresco a calar a boca.
Estou empenhado
e isso é bom:
sou engenheiro e operário
ao mesmo tempo.
Estou empenhado
e isso é mau:
já só sobram os dedos.