8.5.15

Sapatos trocados

Pegou no copo de vinho
bebeu-o até à última gota.
Bebeu outro.
Três, quatro
a garrafa inteira.
Uma segunda garrafa.
Julgava-se, então, filósofo emérito.
Ensaiou a hermenêutica
de um poema mentalmente idealizado.
Sentia as palavras indomáveis
brasonado pela irrefreável criatividade.
Sentia os pensamentos que vinham
com a velocidade do vento sagaz.
Formalizou páginas a eito
sem cuidar de voltar atrás nos parágrafos.
Depois se veria a gesta
quando depois da alvorada
(e ainda imerso em cefaleias próprias)
a lucidez da sobriedade pudesse julgar
a lucidez da embriaguez.
Tinha medo.
Tinha medo que à lucidez embaciada
creditasse préstimo que julgava ausente
na lucidez sóbria.
Depois veio a contumaz interrogação:
como podia ser a lucidez embriagada julgada
pela lucidez da sobriedade
se as duas se amanham por diferentes medidas?
Não obteve solução para nenhum dos enigmas.
Nem voltou ao despautério do vinho excessivo.

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