https://www.youtube.com/watch?v=Fl3WtUrfEyo
[Johánn Johánnsson, “Good Night, Day”]
No esconderijo da noite
subi à véspera da lua
esperei
enquanto era dia
enquanto o verbo não adormecia:
e disse
que podia ser o acontecido
sem que o seu avesso fosse maldição
ou as estrelas que despontavam
páginas à espera de escrita.
Não sabia do sortilégio da rua
e da varanda privilegiada
sabia ser testemunha de tudo
e do nada que de mim se açambarcava.
Valeu-me a modesta ambição,
ou diria,
a desambição assentada em luvas de esgrima
sem que dos penhores quisesse um módico
sem que nos lagos ensombrados
traduzisse as palavras apagadas.
Do esconderijo da noite
enquanto terçava o rosto contra o frio
contei as estrelas
uma a uma;
inventariei os demiúrgicos sentidos
no piano por estrear
com uma voz sibilina como palco
e os meus olhos
insuperáveis
contra a matilha
do venal arrefecimento dos sentidos,
a anestesia incombustível
com a desistência pelo meio.
Angariei a resistência precisa
e de cais em cais
vi transfigurações das palavras
como elas deixavam de ser significante
e se entronizavam metáforas.
A mim trouxe o método impreciso
a pele gasta,
mas à prova de rugas
e dos cabelos agrisalhados
tirei a matriz das coisas
que não hesitam em sua imensa beleza.
Evoquei as manhãs vagarosas
quando o corpo não sabia de fronteiras
e a lucidez ganhava no parapeito da demora.
E esperei.