De nota artística:
o roube eloquente
disfarçado de autoria
militava a favor da estultícia.
Os narradores enfeitiçados compunham a sala.
Do lado de lá da lombada
a audiência
num frémito enquanto as palavras não eram
embuçadas.
Não se sabia do entardecer
que (consta) tinha sido convocado
mas continuava empedernidamente contumaz.
(Acontece
às almas dissidentes
que evocam um sentido de misantropia
de cada vez
que uma multidão é a manta que os acolhe.)
De vez em quando
um murmúrio assaltava o estranho silêncio:
reclamava a seu favor
a atenção das divindades de atalaia
em vez das vezes perdidas
nos corredores da impaciência.
Os luares emaciados não desistiam.
Pediam vozes fundas
que trouxessem no dorso das sílabas
os parapeitos coloridos de verbos famintos.
Às regras enquistadas
sobrepunha-se a angústia escondida
no avesso da língua turgida.
As bocas esperavam
para serem os úberes das vozes que irrompiam
contra a mudez.
(Os roubos invisíveis
tomavam conta das almas sentidas
enquanto a geografia se tornava um verso
e os animais não fugiam do retrato.)
Soubessem das chaves do desmedo
e todos subiriam a palco.
As janelas continuam do avesso
cumprindo-se juras sem fiel depositário
à espera que seja noite
e do crepúsculo se levantem as falas inteiras.
Os bravos meãos silenciados
não arredavam pé:
deles seria o sapato sem paradeiro
ou apenas se cumpriam
como os labores que não perdem pela demora
– e o palco continuava em deserção.
Não importava nada.
Os olhos eram todos campestres
tributários de uma singularidade desarmante
e neles se compunham as estrofes
que pediam sonhos em vez de ouro.