O despertador, estridente.
Persianas que se erguem sobre o dia.
O sono, ainda.
E torpor.
Devo vir de chapéu estendido
para o dia nascente?
Às vezes
antes ficasse na letargia
– penso,
ou julgo que penso,
tomado pela preguiça atónita.
A luz lá fora à minha espera
e o corpo madraço abraçado aos lençóis.
Não sei que luz está à minha espera.
O boletim meteorológico não é de fiar
(ontem adivinhava um dia solarengo).
Se calhar há andorinhas em viagem
ou gaivotas esfaimadas em pose de abutre.
Ou, se calhar,
deixasse eu de perorar em pensamentos
que há banho por tomar
e a lufa-lufa do escritório.
Talvez tenha sorte
daquela menina bonita se sentar ao meu
lado
no elétrico para a baixa.
Ou da varina gorda rogar pragas
vernáculas
a uns rapazotes estroinas que tropeçaram
no cabaz.
Ou de ser vizinho de refeição daquela
atriz de teatro
que deixa os homens loucos
só de cruzar as pernas.
Ou, apenas,
devo sair da cama porque é lá fora
que medra a vida.
Entretanto
07:19.
Faz-se tarde.
Entaramelado
resgato-me do torpor dos pensamentos.
Nós fomos feitos para trabalhar:
para engrossar o pecúlio dos abastados
e pedinchar salário de subsistência.
Pelo menos
é o que protestam as vozes incendiadas
pelos despojos das virtudes.
O ar torna-se denso dentro de casa
insuportavelmente pesado.
A demanda vem da rua.
Do bulício e da indiferença dos
passeantes.
Vou-me à rua
na derrota das rarefações diárias.
Banho tomado.
07:56
a rua sente-me,
enfim.
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