4.12.23

O verbo truncado

É desta extorsão de mim

que arrebato 

o crepúsculo haurido. 

 

As mãos suadas extraem da terra

os sorrisos propedêuticos

as limalhas atiradas ao acaso

contra os olhos ilhéus 

dos operários. 

O que dizer

destes dias circenses

em que muitos se disfarçam deles próprios

fingindo 

que se orquestram na finitude sem regaço?

 

Ah!

o estipêndio joga-se em tabuleiros luxuosos

e são mãos sem rosto 

que esfregam dedos extasiados

e esperam

com a ilusão dos desenganados

que seja sua a sorte vez

eles que nem sabem 

do princípio geral da corrupção. 

 

Os bichos remoem-se

indiferentes

numa gesta improvável

no cesto onde se guardam as frutas

no berço onde gastas se aprendem palavras

contra o fundo poço onde se escondem silêncios. 

 

A combustão sobe a palco

altiva

pergunta quem quer um tumulto de graça

não sem desaprender a graça avinagrada

o sempre distante braço de ferro

que se indispõe 

contra abastados fornecedores de esperanças. 

 

Prossigo a pauta dos dias

eu que continuo a não saber ler música

e persigo vultos que seguem de rastos

como se lambessem a lama 

e depois a bolçassem sobre os distraídos. 

Prossigo

que as demandas se consultam na escuridão

intérpretes da alergia à simpatia gasta

antes preferindo cozinhar as sumptuosas farsas

sozinho no epicentro da periferia

roendo as unhas vestidas de cal

dizendo em apenas murmúrios

um dó-ré-mi apalavrado 

no sofá dos aristocratas. 

 

E se em sonhos me dissolvi

foi porque me esqueci de dormir

escondido na vela hirsuta de um velho veleiro

em mares de nomes que não sei

empunhando o sabre apodrecido

como convém

a um apátrida de guerras

magnificamente condoído na estatura meã

de tudo à volta.

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