Mote: “Economia arrefeceu em pleno Verão”
A economia não gosta de calor
– ou aprendeu a ser termostato,
perita na compensação.
Refúgio nas palavras. A melodia perdida. Libertação. Paulo Vila Maior
Mote: “Economia arrefeceu em pleno Verão”
A economia não gosta de calor
– ou aprendeu a ser termostato,
perita na compensação.
Um escaninho sazonal
emancipa-se da postura municipal
finta o fiscal da obra
e com audácia
aldraba o agente da polícia.
Dantes
quando havia polícia montada
era pior do que nas touradas
– a aritmética dos boçais
em preparos de matiné sanguínea;
agora
por ser agora
e não agoirar a modernidade
a polícia anda desarmada
e não se faz saber
pelo punho das estatísticas armazenadas
que a desordem tenha subido
para a sela da anarquia.
“Manda a verdade”
(dizem os apóstolos dela mesma)
a rebeldia é o cunho dos inexperientes
e sagra-se
com a sazonalidade consanguínea.
Fala barato
o fala-barato
não pode aspirar
à volúpia do luxo
e às dispendiosas palavras
dos que reclamam o pódio
da erudição.
O roteiro não se faz sem passos em falso
na didascália que dá de beber
às nossas dúvidas.
Aparentemente
o sol esconde o magma fundente
e nas artérias corre o sangue amotinado
como se estivesse de atalaia
para as batalhas vincendas.
Depois
há o estrume nas bocas insultuosas
o banal verniz que se abandona de rebate
os poços de morte nas mangas avulsas
um torniquete que aperta os olhos mastins
e as tornas
que validam o passaporte do futuro.
Não seremos bandeiras à mercê de marés;
não seremos
os bombeiros involuntários
que escalam montanhas íngremes;
seremos,
a crer nos ventos dominantes,
ascetas que bebem o vinho novo
sem concessões à letargia
e às danças sem parafuso
que sobem à praça centrípeta.
As premeditações de Ícaro
brandem contra os ventos
que fustigam cemitérios.
Rugem os mastins domados
suplicam pelo verbo pretérito
o véu onde assentava o seu domínio.
No mais alto promontório
as divindades seguram o rochedo
vestem-lhe o arnês entesourado.
O precipício jura o adiamento
e os braços apuram o beijo do escorpião
no amparo da desonestidade em extinção.
Ora
nem dos fracos
nem (ó diletante surpresa)
dos fortes
ora a História,
que a História
não sabe orar.
Os rios
de uma maneira ou de outra
são todos afluentes do mar.
Assim podem atestar
que as angústias todas
ficam condenadas à lassidão
mal tocam no rosto do mar.
Às talhadas
com parcimónia
o dia servido
no cálice de ouro,
medindo trinta e seis horas
(sensivelmente).
À atenção
da multidão de peritos em inglês
(tomo 3):
Engaged
não é
engajado
(a menos que queiram
que noivado
seja engajamento).
À atenção
da multidão de peritos em inglês
(tomo 2):
just in case
=
apenas no caso?
Sou
como uma garrafa
possivelmente enjeitada e deitada ao mar
sem saber
o paradeiro do marinheiro
sem saber
onde a garrafa foi rejeitada
sem saber
se a garrafa esconde no seu interior
enigmática ou não mensagem
ou apenas mensagem alguma.
Ou sou
como o marinheiro angustiado ou não
que enjeitou a garrafa
ou apenas a entregou nos braços do mar
por enfada com a rotina
ou, talvez,
porque a garrafa apenas fugiu das mãos
devido ao excesso de álcool.
Ou sou
como o anónimo que longe ou perto
alcançou a garrafa
e, vá-se lá saber,
ficou indiferente
ou a desalfandegou da estadia no mar
para saber
se escondia um segredo
ou um tesouro.
No estirador
dois êmbolos desengonçados
esperam a combustão.
Estão a par
e confirmam-se que são pares
e não é por serem em número par.
A ignição fará o milagre da química
quando o ronronar do engenho
vier alimentado pela fricção dos êmbolos.
É como uma peça composta para piano
os dedos do pianista
a percutirem as teclas do piano
enquanto os ouvidos extasiados dos ouvintes
encenam os labirintos onde se exilam:
a música
é a vacina de que precisam
como tantos outros
contribuintes líquidos
para a atmosférica poluição
a partir da fricção dos êmbolos,
imersos na combustão que os leva
de um lugar para o outro
e deste para a angústia
diligentemente anunciada
da decadência dos lugares onde vivemos.
À atenção
da multidão de peritos em inglês:
at the end of the day
não é
no fim do dia.