25.5.21

A noite

A noite é a besta negra que descoloniza a lucidez. 

À noite, as luzes bruxuleantes são sentinelas. 

As luzes ímanes, tatuadas na pele, desenham a coreografia dos opostos. 

As luzes lisérgicas desocupam o sono de um mapa amarrotado. 

As luzes são desfiladeiros habitados por fantasmas deserdados.

Por fantasmas que traduzem a liberdade para um idioma com deslimites.

A noite invernal atravessa as ruas e o corpo quente que a desmente. 

É a noite que se deita nas mãos artesãs, a espoliar o medo. 

A noite contumaz, verbo ou equação, morada do sortilégio.

A noite que espera pela manhã.

A noite que desafia a manhã, desembainhando a espada que roça o abismo.

A noite, que enquanto não é manhã mergulha na vertigem dos sentidos.

A noite que tutela a lua caiada de estrofes.

A noite, penhor da solidão.

Miradouro que se atreve a escrever as palavras proibidas.

À boca da noite, um palimpsesto dos rostos imarcescíveis. 

Na noite que é maternidade no estirador de uns olhos diligentes.

Da noite que não devora os corpos. 

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