As facas coladas às palavras
arrastam a infâmia
que não deixa ninguém
órfão.
Parece que as pessoas nasceram
inimigas mútuas;
parece
que se movem com os cotovelos
em cima dos olhos dos outros
uma coreografia dantesca
feita de braços e pernas e torsos
sem cabeças visíveis
num contorcionismo réptil
os dias estendidos no lodo putrefacto
e todos os nomes deitados na usura sem autor
como se todos apenas esperassem
que a véspera não fosse tão pior de hedionda
do que o dia consecutivo.
As pessoas desaprenderam de ouvir
desaprenderam de falar
desaprenderam;
ou talvez apenas tivessem fingido
disfarçando com um véu pesado
a omissão da civilização tão peticionada.
Os pulsos aguentam as pás do tempo
o ultraje dos outros que aparecem em contramão
as cruzes inválidas que se deitam nas bandeiras
as palavras agressoras que corrompem espíritos
tornados guerreiros por vocação
como se aos dentes fossem buscar as balas
que atravessam como relâmpagos
a carne feita presa de inocentes que nunca são.
Todas as máquinas conspiram
no lauto palco da agressividade.
As ofensas foram descontadas da razão
e voam céleres de apeadeiro em apeadeiro
entram nas casas
mesmo nas que estão seladas contra os elementos
– e as provações arrancadas ao medo ilegítimo
passaram a fazer parte da tabela de elementos
contra os testamentos de boa vontade
as vírgulas que desembaraçam a lisura
que mais parece
tudo por junto
que a matemática conspira contra a madrugada
os olhos sentados nos espiões lisérgicos
encomendam a tela de xisto
onde os dedos alagados em tintas superficiais
se vão deitar e adormecer
contra a recomendação dos provérbios.
Não confidencia, a casta
nem mesmo
quando as cãs se apoderam da pele
e num agasto incondicional
cobrem de orgulho assassino
os berços que alojam as taças vãs.
