Olhava
o fundo bem fundo
de uma garrafa
sem saber de que latitude proviera
sem saber do paradeiro
de quem a deixara à mercê
do mar.
Olhava
o fundo bem fundo
da garrafa.
Parecia enferrujada pelo salitre
a cor desbotada
e no seu fundo bem fundo
assentavam os vestígios de um papel
já apenas uma pasta disforme
no que fora
talvez
o segredo do legítimo proprietário
ou apenas um estado de alma
legado
a quem o viesse a tutelar
depois de o mar
vomitar a garrafa puída
num lugar ao acaso.
Olhava
o fundo bem fundo
da garrafa
e não soube dizer
às demandas postuladas
se o estado de alma se contagiava
se podia ser o mecenas do segredo
ou se estava anestesiado
pelo tremor da especulação.
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