5.1.23

O apátrida de alma

Se a alma não me esquece

neste tribunal de especial instância

em que minha pária condição se atesta

hei de ser credor de absolvição?

 

Se da alma não esqueço

cumprem-se mil costumeiros arrependimentos

antes que seja intentada a indulgência máxima

no fojo ermo onde se move a medula sísmica. 

 

Se não for intencional o exílio da alma

hei de povoar a herança

com o nefasto odor a vazio

decretado por vultos eminentes

nos corredores de um labirinto medonho. 

 

Se a alma não se sublevar

peticionando o irremediável meu estatuto

hei de ser suprimido do inventário geral

dissolvido na chuva ácida 

do olvido. 

 

Se à alma não disser adeus

serei 

– quem sabe? – 

pirata de mim mesmo

tarefeiro sem serventia

um coloquial abstinente das matérias ingentes

apenas

magma sem fundo

engenheiro sem matemática sistemática

errante

errante como me dispus

neste tabuleiro pútrido

onde têm cabimento os sequazes

os diligentes patriarcas do princípio geral da farsa

com olhos disfarçados

pele mumificada

e sua, essa alma,

sua

a alma que sua a improfícua cacofonia

de quem muito diz e pouco faz. 

 

Nestes termos

me declaro

apátrida de alma.  

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