30.1.23

Umas páginas avulsas de História do futuro

Pequena seria a incumbência 

se não fosse ao fado autorizado 

o estatuto de mito afivelado

estandarte dos prantos 

em que se debate uma terra inteira

tornando-a alagadiça

de tantas lágrimas que fecundam

um caudal de nostalgia

e o cimento da saudade 

 

– da saudade que devia ser desorgulho

de tanto meter a terra a olhar para trás

em vez de para a frente a fazer andar.

 

De tanta melancolia emparedada

tanta a angústia servente do fado

aviva-se, cristalino,

por que tristezas não pagam dívidas.

Não pagam

é só olhar para os inventários públicos

e pedir à estatística uns cálculos emprestados

 

(só para fazer jus

ao princípio geral da dívida).

 

E esta terra tem-nas

dívidas 

(e tristezas a rodos)

como se fosse uma piscina 

a hastear-se

mais alta do que o corpo

acima de todos os fingimentos

e dos pueris que se disfarçam de fidalgos

e são tão falidos como a pátria endividada 

 

– essa que é 

uma mátria 

avinagrada.

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