25.5.23

Ar condicionado

O xisto debruado na boca

ajeita as palavras

parecem:

estrofes;

ou um candeeiro todavia fundido

à espera de vez

no fundo do mar

sem lá ter sido encontrado

por naufrágio.

 

A boca naufraga

trémula

desajeitada

diz umas palavras desastradas

antes que na noite decrete

o silêncio

e os ardinas da luminescência arvorem

o princípio geral do universo

e a sua incontestabilidade.

 

Os rebeldes sobem à cena

tomando conta da noite

prometendo demoras

e algum vinho

jurando oposição às incontestáveis coisas

assim encenadas. 

 

As vozes disfarçadas de colibri

coonestam os penhascos que vomitam água

mesmo no auge do cachão

e em baixo o tremor contínuo

ensurdecedor

embacia as falas que ousam.

 

É melhor assim

(alvitra o visitante)

o silêncio traduz a melhor fala.  

E pensou

o que seria de um corpo em queda livre

sem arnês

à mercê do turbilhão tempestuoso

o que seria do corpo se não fosse despedaçado.

 

Um pouco à frente

mesmo depois da fina bruma 

dissipada num arco-íris

o leito amansa numa lagoa que se alarga

e as margens pedem cais 

para os destroços do cachão.

 

Mumificado

o musgo-testemunha

empresta um lugar acetinado aos visitantes.

 

Entardece.

enquanto o silvo das aves tardias

se mistura com o rumor já distante do cachão.

A boca insiste em palavras metálicas

como se fosse preciso desenjoar 

e um dia aprazível estivesse adulterado

pelo cansaço dos excessos.

 

As vozes tardias

as que foram paridas para desmanchar prazeres

começam a arrastar o oxigénio

para a falésia onde está o sono.

Tiraram a vez

aos demónios que esbracejam a farda

enquanto juram acertar contas com o futuro.

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