Jogo
no rebordo da silhueta
todo o meu espólio.
Os violinos ensinam o canto
no ensaio deliberado da noite
entre arbustos e pedras estremunhadas
e o mel órfão.
Possíveis ecos
de palavras esquecidas
entrelaçam-se na pauta articulada
em rumorejos excruciantes sobre a pele.
Jogo tudo.
Posso tudo perder
mas confio nas fichas arrematadas
confio
no estuário que oferece o conforto
nas páginas que esperam os versos válidos.
É no rebordo da silhueta
que me arquiteto
inconfessável artesão do desejo
(ou será
artesão dos inconfessáveis desejos?)
no incenso obtido com a corrupção da alma.
Todavia
não capitulo:
não mexo um braço a favor da comiseração
em achando a comiseração
presente envenenado
o invólucro de uma bondade do avesso
(a que se faz em benefício próprio
sob disfarce da bondade exterior).
Sob a tutela da silhueta delimitada
angario o vinho perene
levanto as persianas persistentes
desocupo o céu das inválidas nuvens
– chamo a noite
chamo a silhueta
que demanda as minhas mãos
seu escultor;
para que a silhueta ganhe forma
e seja matéria oferecida ao desejo
(inconfessável).