12.10.18

Reciclagem

Veredicto:
o impensável estiolar da abóbada
que encima o pensamento
é a alfândega das palavras. 
Crestam ideias
fervilham no mapa desembainhado
e afivelam-se, 
exauridas,
no corpo gasto das negações. 

As sílabas vagarosas não ajudam. 

Diz-se
que meteóricos pensares
não são bons conselheiros;
com o arrastar das sílabas
sobra o mosto árido
o papel onde assenta o desperdício
a espetacular falência do entardecer. 

Procuro uma prova de vida.
Procuro uma pétala perdida
o despontar da manhã radiosa
(ou não: apenas um despontar)
um caldeirão em ebulição
a mesa rasa sem cadeiras à volta
o silêncio 
a troça dos solenes
a visível aurora empenhada
a intervenção sem mediadores. 

Conjugo o verbo no tempo certo.
Julgo
que conjugo o verbo no tempo certo.

Na encruzilhada de imagens
deixo as palavras emaranhadas
um hábito por fazer
com a ajuda de improváveis estetas. 
Atiro a perfídia ao ar
como se fosse moeda avulsa
e junto com as mãos húmidas
os destroços da ousadia. 

Não sei mais nada. 
Não quero saber mais nada. 
E todavia sei que é pouco
muito pouco
tudo o que sei:
por mesmo o que julgo saber
não ter rima com o conhecimento
sob os auspícios do que não sei desconhecer.

São imprestáveis
as palavras assim ditas. 
Abatem-se como trovoadas medonhas
ou como sismos apocalípticos
desmentindo tudo o que esteja à volta 
– até o desconhecimento 
que se desconhece.

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