11.9.13

Depois da noite tempestuosa


Archotes incensados
vertem a luz que dantes era ausência.
Nas cinzas arqueadas no chão
a mácula de tempos abraseados.
Mas as cores reavivaram,
encontraram cais onde aportar.
Tudo se interroga.
Tudo, como se certezas fossem apenas
incógnitas.
Os sobressaltos contínuos estão extintos.
Ao acordar
por entre a penumbra caldeada pela luz fresca,
o querer inspecionar o mundo.
De o meter na palma da mão
e depois a abrir
e ele voar no amplexo da liberdade.
Na posse dos archotes em sua chama
jurando as preces que alindam
o inteiro mundo.

6.8.13

Post scriptum


A capa de gelo:
frontaria reluzente
onde o sol se aninha.
À noite,
quando o frio consome
as entranhas de tudo
e a lua adeja no firmamento,
as veias incandescem.
O lugar dos contrários refaz-se,
desafio.
Os olhos não se demitem.
As mãos ensopadas em suor,
dedilham no céu opaco
os esboços da alvorada devolvida.
Os amanhãs deixam de ser
uma espessa camada com sabor a nada.
O gelo transformou a hibernação
em quadro tingido a fogo.
Agora o doravante já não é pesadelo perene.

4.5.13

Oxalá


Sai do sangue
sem contudo pesar
a irradiação que alimenta o tempo.

Sai com o sangue
demora-se e contempla
o devir prometido que tarda.

E se for só com sangue
a custo tanto a que vêm os partos difíceis
será com o sangue assim derramado
que o entardecer do porvir
virá a seu tempo.

11.2.13

Páginas a soldo


Sabias os olhos furtivos
sabias os cais embaciados
sabias as mãos quentes
e sabias as bocas corajosas.

Lias as palavras macias
lias os mundos desconhecidos
lias os mistérios no nevoeiro
e lias os segredos no gorjear dos pássaros.

E não sabias se leras
ou se fora só a campânula dos sonhos.
Que importava se tudo o que contava
eram os contos segredados pela maresia?

27.12.12

Descarnados


Só se ouve a serenidade.
A continência dos olhos que se não marejam
as mãos em sua impaciência
dois corpos interlocutores de um pressentimento
um pulsar em simbiose
as flores numa jarra, decantando despojos.
As noites que se metem na luz clara
e os sobressaltos que jazem, emoldurados em nada.
Somos tutores de um tempo que é nosso.
Só nosso.
Domámos o tempo fugidio.
Só contam os porvires onde se entrelaçam as mãos quentes.
Pelo meio dos olhares,
onde o mar se funde com o céu;
e por entre os olhares,
onde os corpos se fundem e são devolvidos à sua grandeza.
Ou encontram a grandeza que fora desconhecida.
Um rasto da serenidade que mede um mundo inteiro.