9.12.22

Pivot

É a fulgurante incisão dos desacontecimentos

como se fosse 

o desapertar de uma camisa-de-forças

a lava intempestiva que fala com a boca do vulcão

ou a cordilheira que se agiganta no espaço do olhar:

em tudo 

espectros demissionários

vultos às voltas com insónias

extintos, enfim, 

com a água retirada de uma boca de incêndio,

as mordaças que calaram o passado

os fogos ateados à pele arrefecida

os palcos feitos de sobressaltos

os hotéis onde moravam pesadelos mordazes

todas as vendas que condenavam ao silêncio

e as cortinas onde desmaiava 

o entendimento de tudo. 

Agora

só contam os agoras retesados

num leilão sem agenda

a boca que precisa das palavras irrefreáveis

o teatro onde se jogam as farsas sem máscara

contra os mendazes que enchem a boca de verdade

(em mentiras elevadas ao quadrado)

os vocais embaixadores de causas avulsas

que escrevem leis de bronze em camas de xisto,

todavia,

em tinta sem ser impermeável

que se abate com as chuvas inaugurais. 

Este é o desacontecimento

a desfiguração do mundo teimosamente ideal

reduzido à sua imensa fragilidade,

enfim,

ao reconhecimento da sua escondida fortaleza. 

Sem aspas nem metáforas a arredondar as palavras

sem compensações por perdas que são pretextos

sem o exaurido lugar em que todos procuram

habitar um lugar 

que não é seu. 

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