8.1.16

Orquestra

Os objetos animados.
Cores.
Uma crisálida de palavras.
A clepsidra dá as horas.
A voz radiofónica proclama as novas
(as boas, as más e as outras).
Não é em vão que as mãos se dão.
E, ainda assim, é o olhar que diz tudo.
Substitui as palavras.
Que o olhar não se esconda
atrás de um biombo.

Os ângulos diferentes.
E os objetos inanimados.
Palcos onde se movem
enquanto nuvens esparsas
dançam acima do olhar.
As cores transfiguradas ornamentam o cenário.
Os dedos tecem-se entre as texturas
entrelaçam-se no calor estival dos corpos.
As mãos
as mãos suadas
dizem o que as palavras entretecem.
Os biombos são espinhos pétreos
obra terçada contra a modéstia.
Por isso,
as mãos levantam-se
em preces pagãs que convocam
o fado atilado.
Exoneradas as trevas
mercê dos bons ofícios da purificação.

Os objetos todos
deitados numa pauta
em forma de notas musicais.
Primeiro, rarefeitas.
Depois,
em crescendo
numa orgia de sons que povoam
arrebatamento.
Um piano imaginado.
E um pianista de circunstância
que salta da audiência e oferece préstimos.
A intempérie
esmaga-se contra o parapeito das lágrimas
mistura-se com elas.
E elas
dissolvidas na chuva abundante
encarecem as palavras volúveis.
Pode ser
que as mãos suadas
acabem em volúpia.
E os corpos abraseados
façam subir as montanhas
e os rios caudalosos,
até se deporem no púlpito do deleite.

Na televisão
correm imagens disformes.
Enquanto a penumbra derrota o dia
e os corpos cansados tirocinam vagar
há por todo o lado
rostos sorridentes
rostos sombrios
mãos frias
corpos arqueados
gente triste e gente alegre
e os gatos abrigados que ensinam
o vagar.
Os objetos coreografados pela melodia
deslizam com amenidade;
dir-se-ia
não deixam rasto no chão da sala.
Os olhos prostrados assistem.
Digerem as imagens dos objetos em sua dança
e da dança dos corpos adestrados pela volúpia.

À noite
quando o sono tiver lugar
já nada disto tem império.

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