18.12.19

Agente à paisana

Era como ir a uma loja de guloseimas
e nós
tomados pela passividade dos desinteressados
indiferentes à mercadoria.

Era como temperar com fogo
a combustão implacável do vulcão
deitando-se sobre as nossas peles
e nós
hipotecados pelo inverno alinhavado
embebidos na fuligem das cinzas
mordendo os corpos em ebulição.

Era como lacrimejar no apogeu da angústia
e nós
consumidos pela melancolia sem razão
fugíssemos do cais impreciso
onde reluziam os néones refulgentes.

Era como beber um vinho encorpado
dando as bocas ao desejo insondável
o desejo como lava subindo pelas paredes
e nós
tementes apenas da convocatória dos prazeres
suseranos das coisas entronizadas.

Era como saber não fingir
E nós
Atores à paisana, 
sem palco
senhores das nossas palavras
fortalezas sem acesso ao fora de nós
cinzelássemos as fronteiras sem limites.

Era como povoar um lugar mudo
e nós
penhores de todos os silêncios
disséssemos as palavras altas
sem recusar os proventos da ternura.

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