De cada vez que havia penumbra
o mosto do medo tornava-se
a saliva da extinção.
As cortinas eram muros ermos
ao mesmo tempo muralha e algema
insensato pedaço de verbo
nas sílabas vagarosas que arrastavam o dia.
Dizia alguém:
devias sentir o que eu sinto.
Houvesse quem recordasse
ser um logro a demanda
por imperativo do princípio
da intransferibilidade dos sentidos.
Como pode alguém convocar
uma comiseração destas
a não ser na demência da dor
que consome até os ossos?
Pode alguém conter a ideia
que as consumições se perfilham
com almas que se protestem generosas?
Os cânones são implicáveis, contudo:
a solidariedade é exigência
ainda que seja não mais
que um logro para libertar interiores dores
que mergulham
os labirínticos corredores da alma
numa castração
se não souberem peticionar
a piedade com as presas dos infortúnios.
Ao que dizem
a hipocrisia sempre foi o selo dos disfarces,
o teatro supremo
em que todas as boas almas
são alistadas.
A hipocrisia.
A cortina plúmbea que se abate sobre os rostos
uma pousada onde temos o rogo
das exonerações das más carnes
que nos consomem.
Saiba na melhor das fazendas,
a que desaproveita a densidade das interpelações,
que o logro seja meu
é que do fado inscrito no oráculo
esteja o alinhamento com o palco sem limites
onde se confecionam
o princípio geral do fingimento.
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