7.2.23

220 volts

Batem por dentro

no avesso das pálpebras

as palavras atónitas

o sal hirsuto do mar

o vento em protesto

os corpos desassisados

fulgurantes centelhas em meneios

nos antípodas da carne apaziguada.

Se fossem exílio

as asas apressadas seriam maneirismo

um fingimento a calhar em estrofes

ornato precioso na bolsa sem fundo.

Mas não são.

Suplicam as bocas foragidas

em idiomas por inventariar

os modos sem instruções

uma gramática por cada pessoa

um tribunal inferior que seja bastante

no imprevidente salvo-conduto

à fortificação apresentado.

A roupa torcida

não se amarrota na descompostura:

dela é a marca registada dos habilitados

o corpo em preparos inverosímeis

como se acabasse de escolher um púlpito

e não deixasse em memória futura

herança a caber.

Os dias são iguais.

Arrumo os escombros na fileira do esquecimento

e dou o inteiro de mim à acintosa manhã

eu que sou meão

e não aspiro a que do meu nome saibam 

paradeiro.

Não seja em mim encontrada 

a peugada da heráldica

que da orfandade 

tenho uma impressão da espécie.

Em todas as marés

desapareço

fundindo o vulto em que me tornei

na espuma levantada pelos mares desarrumados.

Sou como um navio

a água do mar como morada

e o rosto como a lombada de livros em barda,

o demais escondido do voyeurístico espiolhar.

Sou

exílio por dentro

os pulmões cheios de versos por saber

e uma manhã que se confunde

com os acordes em espera.

Sou

a provável fragilidade

que se não esconde

o lema tirado à sorte

(ou atirado à sorte)

na filigrana em que se habilitaram as mãos.

Espero por o que não posso esperar

e nisso faço-o não-espera

o vocábulo irredentista

a fação compulsiva que arremete contra o dia

em mil e duzentos archotes que dividem a avenida

enquanto se espera 

aquilo por que não se pode esperar.

Sem comentários: