A estátua consuma
as folhas rasteiras
no umbral do outono.
Não serão as réstias do tempo
no módico latejar das veias
por as velas se desembaraçarem do vento
em golpes fortuitos,
precisos
exclamados por um braço forte.
Sobre a almofada da madrugada
ouço os gatos vadios
o rumorejo da maré-baixa
as lágrimas que assentam na areia,
o orvalho liquefeito,
as mãos endurecidas
pelo âmago dos seixos deixados pela maré.
Dou aos ouvidos as preces insistentes.
Pode ser que a pele se acostume
e a chuva vespertina cuide do resto.
Não cicio as palavras
sem as folhas por perto
na lombada estreita do livro promitente.
Sem o encanto das cotovias
nos seus estroinas voos rasantes
adormeço sem contar.
Sinto o corpo sacudido
e não é se não o sismo interior
que traduz as inquietações
que as traduz em forma de sonho.
Se chegar a manhã
na teimosia do nevoeiro baço
oxalá estejam prontos os versos
no esconderijo do pensamento;
oxalá sejam digeríveis
na combustão dos braços que se entrelaçam
sem a demora das lágrimas
reservadas em favos que condensam
toda a doçura;
das lágrimas que secaram
num parêntesis dos olhos
que deixaram órfã a bulimia dos sentidos.
Ao amanhã
não digo nada:
quero-o inteiro
imune às profecias
servo do espontâneo esvoaçar
digno de uma coreografia de peritos
insuspeitamente demiúrgico.
Desse amanhã
conservo a memória não atribulada
e reescrevo o oráculo que teimava
na persistente mentira de si mesmo.
A estátua
indiferente
remoça a claridade intimidada
lavrando o nevoeiro contumaz
em promessas de futura chuva.
Será inverno,
então,
e eu sem arrependimento.
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