Não é por acaso
que sinto a areia lisa
no recobro da maré cheia.
Confeciono os limites para trespassar
a acrobacia estouvada dos dias sucessivos
e deixo no logradouro
os vestígios da imagem em decadência
– fujo da imagem em decadência.
No dealbar da noite
transigem os demónios
à medida que avanço no labirinto.
Não sinto a dor.
Não sinto o pavor
das paredes que se estreitam
estafetas de um vazio ensurdecedor
com a conivência de um teto que se abate
sob o prumo da água que aprisiona o chão.
Não é por acaso
que deserto da lisa areia
e do sono empenhado:
a vastidão da planície
na indiferença da paisagem
costura o silêncio imperativo;
à míngua de palavras
sinto a boca secar no jazigo da impaciência.
Dantes,
quando as praças eram só praças
e os jardins albergavam botânica,
não sabia do paradeiro de outras complexidades.
Hoje
empenho-me na infecunda inquietação
em comboios desordenados
que não freiam o sentido
e nos apeadeiros ao acaso
amadureço o reduto da paciência
a comiseração em que me autocontemplo
anestesiado das dores
que de mim fizerem aeroporto
insensível aos cometimentos ao mundo lá fora.
Se ao menos pudesse
encantar uma serpente
hibernar da hibernação no limiar do precipício
cinzelar o meu nome numa pedra anónima
e dizer
a quem quisesse ouvir
ele há tantos embustes à roda do mundo
que mais vale sermos plenos tutores
do sereno esmaecer para que todos vamos.