11.10.23

Pleito

Dei de mim amostra ao magma inteiro

uma pletora de rios fundos e de frias águas. 

 

Ontem 

arrastei os ossos contra a maré

desviei os prantos de colisões desnecessárias

e os furtivos ventos alisaram a descompostura

antes que de mim se hipotecasse

um grama de alma. 

 

Os provérbios fogem pela escotilha

juntam-se aos procuradores da decência

aos sacerdotes dos costumes 

(têm de ser bons)

e levitam as mãos ateadas 

deixam-nas suadas a saber do frio da noite

sem ouvir a voz mecânica que assalta os sonhos. 

 

Dizem que há profetas que ocupam um lugar. 

 

Devem ser invisíveis

ou puros fantasmas

o porvir continua a desafiar as probabilidades

arquiteto da sua gramática

insensível às sensibilidades que se entrecruzam

dos luditas que trazem em si

as ansiedades ilícitas. 

 

Os campos atravessam os rios

e somos nós

marinheiros despojados

que arrefecemos o aquecimento patológico. 

Às vezes

damos as mãos por cima das redes

é quando os sobressaltos fazem alpinismo

e nos esquecemos do arnês. 

 

Não importam 

os apocalipses prometidos com solenidade;

os curadores que juram curas a eito;

os mercadores de sonhos que começam pelo telhado,

as vozes surdamente cegas em delírios sintomáticos;

a desbeleza a concurso, a banalização da fealdade;

todos os embaraços à sofreguidão da vida:

em mil páginas de inventário

cobram-se honorários usurários

e já não há doutores das almas que cheguem

na invasão das águas mordazes

que contaminam o dia constante.

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