19.4.18

Registo civil

Aconselha-se vivamente:
novelos emparedados
vitela de Lafões
roupa em segunda mão
a dança
emerdar os imerecimentos
enterros
(sem especificações sobre a modalidade)
vistorias a quartéis e a tascas
música variada
(exceto do Godinho)
toalhas para as mãos
vinho late harvest
outras colheitas maduras
a ciência fértil
(menos a de S. Boaventura)
umas presilhas para os olhos
sapatos rombos
quem fala de si na terceira pessoa do singular
piropos canhestros
a boçalidade
vitupérios ordenhados
o úbere dos desfalecimentos
o colesterol da sabedoria
(o de S. Boaventura)
missas pascais
a vulgata das ideologias
(esse genocídio das ideias)
o impropério de almas interessadas noutra almas
cócegas dos bigodes dos gatos
discursos gongóricos
(na linhagem da Assunção)
metralhadoras sem munições
pincéis desarmados
a praia de La Digue
o cinema
(menos as comédias românticas)
os sindicatos e os magnatas pernaltas
a comiseração e o bolçar consequente
um módico de desesperança
a partilha do impossível
a dança
(outra vez)
(em modo Boiler Room)
a modernidade e a pós-modernidade
(e os não conservadorismos)
a Catalunha e sua desespanhização
os reis beócios
a culatra da indiferença
o bulício não belicoso
e a bucólica paisagem
as calças rotas
os rituais litúrgicos com novos bispados
(podem ser os de S. Boaventura)
as aventuras de Gulliver
o leme sem âncora
as portas amarelecidas
biombos para os envergonhados 
gravatas para os estouvados
(menos para o Louçã)
estradas sinuosas
a espera (interminável) por Godot
beijos carnudos
amantes contumazes
aprendizes de ourives
salada de ouriços do mar
a miragem desde o miradouro 
a matança do porco
a estultícia como princípio geral de tudo
(cortesia de cefalópode personagem)
a gritante soberba de si mesmo
a criteriosa humildade
(menos para o Mourinho)
o Heidegger
os desfiles de moda
(e a abundância de frivolidade)
e a moda que não fica na moda
a natação a treze graus centígrados
ilhas
a pudicícia intelectual
um tremor de terra
o altar da alma só com flores permanentes
a viuvez dos sentidos
as fronteiras sem muros
um murmúrio ao ouvido
o reapossar de tudo o que extraía do abismo
a noite surdamente clara
a claridade tonitruante
as framboesas gratificantes
a corrupção do olhar
(à atenção de júris vários)
o penhor dos amanhãs
a música de intervenção
(e os desmentidos amanhãs, que não cantam)
(menos a do Godinho e do Fonseca)
as sereias sem escamas
o sono furtivo
as palavras amadas 
– e o amor que elas encerram.
Vivamente, aconselham-se. 

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