Dar ouvidos
sempre causou espécie
não por ser contra
liberalidades gratuitas
mas por não saber
a quem eram doados os ouvidos
e o que podiam ouvir
com a intermediação do donatário.
Também era razão de perplexidade
descobrir como determinar a transação
se ela peticionava
o arrancar à origem dos ouvidos dados
e se haveria anestesia de permeio
ou a dor seria a paradoxal paga.
(Prenhe da irremediável ingenuidade
não me era dado saber
que dar ouvidos
em sentido corrente,
como expressão idiomática,
é pior do que a sua literalidade.)
Termos em que se aconselha
a não dar ouvidos
ou a cara
ou o corpo
(ao manifesto);
não vá tamanha generosidade
ser de nós próprios
algoz.
Uma vez doados os ouvidos
(ou qualquer parte restante do corpo)
não há remédio
pois colados ao abismo deixado
não é possibilidade a admitir
e os ouvidos
(e partes outras do corpo)
têm préstimo
quando ao corpo pertencem.
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