15.3.18

Autobiografia

Sou feito
da trovoada que medra em mim
desta matéria explosiva
constelação onde todas as estrelas
se aninham
o lago amplo com nenúfares de ornamento
a palavra vertida num cálice
forrado com a alma sem freio
a convulsão labiríntica
e a seguir o céu plano
de onde irradia a claridade sem embaraços.
Feito
desta matéria visível
e da que invisível se esconde
nos contrafortes da montanha desemparedada
da matéria que busca alimento
nas águas velozes dos regatos
onde a neve tardia se fundiu.
Sou feito
da chuva sibilina
e dos prístinos lugares
onde os ossos aprenderam a ser
a funda, estrutural matéria
versada nas estrofes diligentes
nos olhares desembainhados das teias larvares
nos arcanos pesares
na poesia como casa forte.
Sou o penhor de tudo o que me abraça
a bússola esmaecida e, todavia, prestimosa
o húmus rico
as rochas duras que se dão ao peito
eu
sem fingimento
sem algozes admitidos a concurso
só no dorso das caravelas desenhadas
na intemporalidade que se cinde num instante
(ou no instante formulado em intemporalidade).
Colho dos braços das árvores
a água escassa, mas valedoura
e deito os braços ao rio como se fossem remos
só para tomar em meu colo
a mais pura essência que sintetiza meu ser.
Sou feito
de uma aurora boreal
original remate da alvorada
hormonas sem equação como rima
e sigo nas asas do dia
um dia de cada vez
no proveito da vida inteira.

Sem comentários: