8.3.18

Monólogo da indeterminação

Não faço a menor ideia.
De nada.
No assalto das dúvidas
tenho índice numeroso.
Das ideias feitas
das certezas à prova de bala
dos céus eternamente claros
das luas que só irradiam luar alvo
dos profetas que adivinham oráculos:
não faço a menor ideia.
E gosto.
Gosto que as ideias sejam tumultuosas
congraçadas dentro das veias febris
a que apetecem os remoinhos dos opostos
a dança de contraditórios
as interrogações seguidas de interrogações
o deserto de respostas.
Não faço a menor ideia
da base que recebe os sedimento da razão;
pois da razão
julgo ser volátil
matéria que se dissolve entre os dedos
as mãos na impossibilidade de a agarrar.
Não faço a menor ideia
por que se excedem em fantasiosas bússolas
os pederastas da razão
por que tiram a pele à pele
na ambição de saberem algum saber.
Na dúvida
prefiro o contentamento
de não fazer a menor ideia
– nem, muito menos, a maior das ideias.
Quero os livros sem certezas:
argumentos ao sufrágio outro
convite à dissidência
só pelo inexcedível prazer
da argumentação seguida do seu contrário
– sem o imperativo de inventariar vencedor:
não há nas ideias
cunho de superioridade
(e se há em alguns peritos em tresler,
seu é o mal).
Quero aqueles livros
embebidos na intelectual humildade
de serem desmentidos em ilações
atiradas ao escrutínio.

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