9.6.18

Algibeira

Conto os navios
que dormem na baía. 
Gostava de saber
se os marinheiros também dormem
enlaçados no sono dos navios 
– gostava? 
É só uma figura de estilo
que o sono dos outros
é não assunto
e o paradeiro dos navios também. 
Mas o olhar que se demora 
na finitude do mar
esbarra nos cascos enferrujados dos navios, 
que enforcam o pensamento,
distraem-no. 
Os dilemas insondáveis
fatiados em interrogações
tão solenes como invariavelmente inúteis
têm a mesma profundidade 
das âncoras largadas
do fitoplâncton aos milhões nas águas à volta
de um olhar perdido na lonjura do firmamento. 
Se ao menos 
o mar consentisse os seus segredos
o que guarda no avesso de seus fundos
que ouro nobre se dissolve 
no sal que o compõe;
se ao menos 
o mar
este ou qualquer outro
contasse o segredo da maresia
e nas ondas levantadas em forma de coreografia
democratizasse um saber,
as interrogações deixariam de ser 
fértil desejo de um nada
e o saber
assim democratizado
em coro com a resplandecência do mar
se transfigurasse 
num vão de escada
onde voz mais alta teria a banalidade. 
Que é da mesma cor
do sono dos navios
e dos marinheiros
acordados
ou em seu sono de reclusão.

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