27.2.20

O palco onde as nuvens são chão

As nuvens
esconderijos vagos
uma vaga nave para fingidores
contrariados pela condição terrena
que os importuna.

Nas nuvens
anestesiam as consumições
e aproveitam para da paisagem se fazerem
cartógrafos
na hipótese de estarem credenciados
e se não houver oposição das autoridades.

Às nuvens
vão os sonhadores
os arquitetos da palavra
os conhecedores do nada
os madrigais que se entretêm 
a dedilhar paisagens
os tímidos iconoclastas que sabem ser um logro.

Das nuvens
os timoratos bolçam as comendas
distribuindo recomendações por deus e imediações
antes que sejam presas 
das redes emalhadas por pescadores impérvios
mas sempre depois do pequeno-almoço continental.

Por volta das nuvens
quando for hora
dirão os aposentados da paciência
que dela se revigoram no veludo das nuvens
desarmadilhando
as complexas questões existenciais
destituindo
a verossímil verdade sem ancoradouro.

Até às nuvens
a chuva em ato devolutivo
evaporação às arrecuas
sem decair na fantasia do tempo refeito
numa herança alardeada
os corpos têm-se em revoadas
incansáveis
antes que sejam açambarcados 
pela temível, irreparável divindade
saída na tômbola.

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