17.10.16

Janela sem rosto

Talvez houvesse pontes meãs
por onde todo o crédito do mundo
viesse.
E das partidas inteiras do mundo,
abraçado a um manto lanífero,
via o que podia
à custa do nevoeiro timorato.
Teria sabido chamar a mim
os gatos sem casa
os mendigos sem medo da noite e da solidão
as mulheres entristecidas
os barcos vazios rio fora:
e teria juntado com as mãos
as pedras preciosas escondidas
na terra lamacenta
para depois as atear ao aleatório céu de nuvens
esperando pela tômbola consequente.

Talvez
o altruísmo seja um ardil da alma.
Uma cegueira absurda
nos deslimites do eu.

E, no entanto,
a pulsão sem freio adestra para a dádiva
metendo outros à frente do eu exaurido.
Dista da ponte aquífera
a equidistância entre o eu razoável
e o eu que transborda dos limites aprazados.

De frente para a janela embaciada
as gotas de humidade abrem estradas no vidro;
talvez,
por esses interstícios,
consiga saber por onde anda a alma.

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