6.4.17

Amor-âncora

“De que valem todos os atos e pensamentos dos homens no decurso dos séculos face a um único instante de amor?” Friederich Hölderlin

Dizem oráculos escondidos
na sombra da dúvida
que um amor é singular
quando
limpa as lágrimas vertidas
ampara as mãos trémulas
desarvora as bandeiras párias
aquece o sangue deixado em frias águas
e quando
os olhos são o penhor
dos olhos que são seu penhor também
e tudo se transluz
nas ameias da cumplicidade.
E se o singular amor
transfigura a paisagem
derrete a lava dos vulcões
participa nos palcos medonhos
(amaciando os medos, ociosos)
afere as medidas estouvadas
encorpa a loucura benigna,
é por ser singular
e amor
num mesmo tempo
num só tempo
irrepetível, mas perpétuo.
Embebidos os corpos
no sal vistoso apanhado das flores
as montanhas em pano de fundo,
nem as pedras enrugadas do caminho
atemorizam os pés
e os corpos atiram-se num voo fecundo
e fazem seus os domínios avistados
no testamento do amor sem quesitos.
Até que o tempo seja a medida inteira
abraçada pelas mãos juntas
fotografada pelo olhar uníssono
e do tempo sem fim frua
o amor-essência
– com a jactância que guardam os amantes
no mar indomável reduzido
ao suor derramado por seus corpos.
Pois a matemática singular
a que não se ensina nas escolas
e irrompe da porosidade das almas amadas
resgata os amantes
de um trespasse mendaz
das aciduladas páginas a que põem freio.
Do tempo sem fim
na mediação dos amantes
até que da arquitetura dos deuses
sejam seus tutores.

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