4.2.19

Manta de corpos

Corpos amontoados
nus
uns dormindo
outros entretecendo-se uns nos outros
outros ainda dormitando
outros em contemplação
outros partindo em demanda de um corpo par
outros tocando-se
outros falando através dos poros
outros desembainhando o desejo
outros vestindo um agasalho
outros sacudindo o suor
outros ensinando
outros estrofes da sua grandiloquência
outros desmatando o ubere da decadência
outros desenhando outros
outros entronizados num clamor triunfal
outros bebendo na seiva resultante
outros perfumando com suas bocas
outros desistindo do marasmo
outros em declinação, intoxicados
outros em êxtase, intoxicados também
outros dedilhando a pele tremeluzente de outros
outros nos outros
outros saindo de outros
outros em amparo de si mesmos
outros cinematográficos
outros decadentes e mesmo assim a jogo
outros no jugo de outros
outros âncora em espera
outros promitentes de cesuras 
outros timoratos do deleite
outros aprisionados no preconceito
outros desenhando silhuetas
outros iracundos
outros defenestrando fantasmas
outros recitando o sol invernal
outros desaguando na indolência
outros arremedos, na indulgência do medo
outros sarcófagos sem saberem
outros impecavelmente belos
outros banhados em artificialidade
outros iguarias em altruísta pose
outros suplicando pares
outros querendo solidão
outros em tirocínio
outros na vulgata da adulação
outros experimentando
outros sem medo da idade
outros à compra de tempo
outros no invejável Némesis
outros atirados ao precipício
outros exangues
outros elixires intermináveis
corpos
todos
sem a decomposição dos síndicos
e até estes
contra todos os prognósticos
corpos.

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